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Classe do Processo:
07455497420208070016 - (0745549-74.2020.8.07.0016 - Res. 65 CNJ)
Registro do Acórdão Número:
1360985
Data de Julgamento:
10/08/2021
Órgão Julgador:
Segunda Turma Recursal
Relator:
ANA CLAUDIA LOIOLA DE MORAIS MENDES
Data da Intimação ou da Publicação:
Publicado no DJE : 16/08/2021 . Pág.: Sem Página Cadastrada.
Ementa:
  JUIZADO ESPECIAL CÍVEL. CONSUMIDOR. PERÍCIA TÉCNICA. DESNECESSIDADE. PRELIMINAR DE INCOMPETÊNCIA REJEITADA. APARELHO CELULAR NOVO ADQUIRIDO NO EXTERIOR. SÚMULA 8/TUJ. DISTINGUISH. PRECEDENTE. PROMESSA DE TROCA DO APARELHO NO DECORRER DA GARANTIA CONTRATUAL. TROCA NÃO EFETUADA. APLICAÇÃO DA NORMA CONSUMERISTA. APARELHO QUE JAMAIS FUNCIONOU. PRODUTO NOVO VINCULADO A CONTA DIVERSA E COM PEÇAS SOLTAS. PROBLEMA NO PROCESSO DE PRODUÇÃO. DOIS ANOS SEM SOLUÇÃO DO PROBLEMA. SITUAÇÃO QUE SUPERA O MERO ABORRECIMENTO. DANO MORAL CONFIGURADO. QUANTUM ARBITRADO COM RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. RECURSO CONHECIDO. PRELIMINAR REJEITADA E NÃO PROVIDO. I. Trata-se de recurso interposto pela parte ré em face da sentença que julgou procedente em parte os pedidos formulados na inicial para condená-la ao pagamento em favor dos autores da quantia de R$ 13.200,02 a título de danos materiais e R$ 2.000,00 de danos morais em razão de defeito no aparelho celular. Em seu recurso, aduz preliminar de incompetência face a necessidade de prova pericial. No mérito, assinala a perda da garantia em virtude da identificação de modificações no produto que não foram autorizadas, o que caracteriza a culpa exclusiva do consumidor. Enfim, ressalta a inexistência de dano moral. Subsidiariamente, pugna pela redução do valor arbitrado a título de danos morais. II. Recurso próprio, tempestivo e com preparo regular (ID 24597480). Contrarrazões apresentadas (ID 24597491). III. Não há necessidade de realização de laudo pericial para a solução da demanda. Isso porque os documentos juntados na inicial demonstram que a parte ré já emitiu laudo sobre as condições do aparelho, bem como encaminhou a situação para análise aprofundada junto ao ?especialista sênior? com posterior remessa do caso para que fosse apreciado pelos especialistas da empresa nos Estados Unidos. Preliminar de incompetência dos juizados especiais rejeitada. IV. Dispõe a Súmula nº 8 da Turma de Uniformização de Jurisprudência que ?1. Os produtos de consumo adquiridos em país estrangeiro não gozam da mesma proteção jurídica outorgada pelas normas brasileiras de proteção e defesa do consumidor, destinadas aos negócios celebrados em território nacional. 2. É competente o juiz brasileiro para o processo e julgamento da causa em que o consumidor, baseado na norma estrangeira ou na garantia contratual, busca proteção jurídica a produto adquirido no estrangeiro, contra pessoa jurídica domiciliada no Brasil, assim definida no parágrafo único do art. 21 do CPC?. Assim, aplicando o referido enunciado, esta E. Turma Recursal já ressaltou que ?3. Desta forma, pacificou-se o entendimento entre as Turmas Recursais do DF no sentido de que, via de regra, ao produto comprado no exterior não se aplica a garantia contratual própria de bens alienados no Brasil, salvo se adquirida garantia global para o aparelho.? (Acórdão 1160052, 07029607820178070014, Relator: JOÃO LUÍS FISCHER DIAS, Segunda Turma Recursal, data de julgamento: 20/3/2019, publicado no DJE: 1/4/2019. Pág.: Sem Página Cadastrada.) V. Quanto ao aparelho adquirido, constata-se que o termo de garantia assinala que: ?Como a lei do consumidor se aplica a esta garantia: esta garantia concede direitos legais específicos ao adquirente, que pode ter outros direitos que variam conforme o estado (ou país). Com exceção do permitido por lei, a Apple não exclui, limita nem suspende quaisquer outros direitos que você possa ter, inclusive aqueles decorrentes da não conformidade com o contrato de venda. Para o pleno conhecimento de seus direitos, consulte as leis aplicáveis de seu país, província ou estado. Limitações da garantia sujeitas à lei do consumidor: na medida permitida por lei, esta garantia e as condições ora previstas são exclusivas e substituem todas as demais garantias, reparações e condições, sejam verbais, escritas, legais, expressas ou implícitas. A Apple se isenta de todas as garantias legais e implícitas, inclusive, entre outras, garantias de comercialização e adequação a um propósito específico e garantias contra defeitos ocultos ou não aparentes, na medida em que for permitido por lei. Se a isenção dessas garantias não for permitida, a Apple limitará a duração e os recursos de tais garantias à duração desta garantia expressa e, a seu critério, os serviços de reparo ou substituição descritos abaixo. Alguns estados e países não permitem limitações à duração de uma garantia (ou condição) implícita, por isso a limitação acima pode não se aplicar a você. O que está coberto por esta garantia? A Apple garante o produto de hardware da marca Apple iphone, ipad, ipod, apple tv or homepod e os acessórios da marca Apple contidos na embalagem original ("produto Apple") quanto a defeitos de fabricação e mão de obra quando utilizados sob condições normais, de acordo com as diretrizes publicadas pela Apple, pelo período de um (1) ano contado da data da compra pelo usuário final ("período de garantia"). O período de garantia já inclui o prazo de garantia legal previsto na legislação de seu país ou estado. As diretrizes publicadas pela Apple incluem, entre outras, informações contidas nas especificações técnicas, nos manuais do usuário e nas comunicações de serviço. Nota: todas as reclamações efetuadas durante o período da garantia limitada de um ano Apple serão regidas pelos termos desta garantia.? (ID 24597461, pág. 7 - https://www.Apple.com/legal/warranty/products/ios-warranty-brazilian-portuguese.html VI. Desse modo, não se desconhece que a análise da Súmula 8 da TUJ sugere que a norma consumerista não deveria incidir no caso concreto face a aquisição do produto no exterior, sendo aplicado os termos da garantia contratual. Ademais, é possível extrair da garantia fornecida pela parte ré que a empresa oferta a garantia contratual pelo período de um ano contado da data da compra (já incluído o prazo de garantia legal previsto na legislação do país do adquirente do produto), sendo que o aparelho foi adquirido no dia 02/03/2019 e a demanda ajuizada em 29/10/2020, ou seja, após o prazo de um ano da garantia contratual. VII. Entretanto, respeitadas as devidas peculiaridades, esta E. Turma Recursal possui posicionamento recente envolvendo a mesma parte ré onde foi assinalada a possibilidade de aplicação do CDC relativo a produto adquirido no exterior quando a empresa se compromete a entregar um aparelho novo em perfeito estado de funcionamento ao cliente (o que é a situação dos autos). Neste sentido: ?5. Em que pese a súmula afirmar que os produtos de consumo adquirido em país estrangeiro não gozam da mesma proteção jurídica conferida pelo CDC, no caso concreto, a ré autorizou a troca do aparelho do autor, o que foi realizado. Dessa forma, a ré tinha o dever de entregar um novo aparelho em perfeito funcionamento, implicitamente concordando em se submeter à jurisdição brasileira. Do contrário, deveria ter negado a garantia logo no primeiro momento.  (...) 8. O aparelho substituído devia ter sido entregue ao consumidor em perfeitas condições de uso. Observa-se que o aparelho foi substituído por autorizada situada no Brasil, inexistindo razão para o argumento de que o aparelho estaria bloqueado pela empresa estrangeira que forneceu o aparelho ao autor.  Assim, comprovada a existência de vício/ defeito deve proceder à substituição do aparelho celular por outro com as mesmas características ou superiores, nos termos do art. 18 do CDC. (Acórdão 1335815, 07050115720208070014, Relator: ARNALDO CORRÊA SILVA, Segunda Turma Recursal, data de julgamento: 26/4/2021, publicado no DJE: 5/5/2021. Pág.: Sem Página Cadastrada.)  VIII. Destaca-se que as provas nos autos são suficientes para atestar a verossimilhança do relato exposto pelos autores. Isso porque, após a aquisição do aparelho ?Iphone XS 512gb? em loja oficial da parte ré situada nos Estados Unidos (ID 24597223), os autores retornaram ao Brasil no dia 11/03/2019 (ID 24597224), quando abriram o aparelho novo e identificaram que não estava funcionando. Esclarecem que, inicialmente, tentaram a solução ao comparecem na loja física no Brasil, sem sucesso. Desse modo, a situação foi levada a outros canais de suporte, sendo que os e-mails juntados demonstram que a partir do início de abril de 2019 a parte autora passou a receber as respostas por escrito da solicitação para a solução do problema, onde é possível apurar que a parte ré não conseguia realizar o reparo/ativação do aparelho. Isso porque, inicialmente, a parte ré concluiu que o aparelho possuía um bloqueio de ativação, o que não conseguia solucionar e impedia o funcionamento (ID 24597225 - 11/04/2019). Neste momento, a parte consumidora afirmou que não aceitaria tal conduta da parte ré, uma vez que o aparelho era novo. Desse modo, a parte autora esclareceu que a questão do bloqueio desconhecido no aparelho foi solucionada. Contudo, enquanto aguardava o retorno do seu aparelho, foi emitida pela parte ré outra resposta após alguns dias, onde afirmou para a parte autora que o seu produto estava com peças rompidas e soltas (ID 24597228 - 16/04/2019). Após o transcurso de mais de um mês do alegado defeito nas peças do aparelho, sem qualquer solução apesar de várias tentativas neste sentido, a parte ré voltou a alegar que o aparelho estava bloqueado, face estar acionado o recurso ?buscar iphone?, o que impediria a troca das peças (ID 24597235 e ID 24597236 - 27/05/2019 e 28/05/2019), sendo que a consumidora esclarece que lhe foi informado que o bloqueio (função buscar iphone ativada) era decorrente do fato do aparelho estar vinculado a uma conta originária da China. No decorrer dos meses seguintes o caso foi analisado pelo ?suporte sênior? da empresa, que levou a situação aos setores superiores, situado nos Estados Unidos (IDs 24597243-24597245), sendo que durante meses a empresa não emitia uma resposta final para a cliente. Enfim, em setembro de 2019 a parte ré informou que a troca do aparelho por um novo teria sido aprovada e que estava pendente apenas a aprovação do envio (ID 24597246). Contudo, o aparelho não foi enviado para a parte autora. IX. Neste ponto, salutar reforçar que no precedente mencionado (Acórdão 1335815, 07050115720208070014, Relator: ARNALDO CORRÊA SILVA, Segunda Turma Recursal, data de julgamento: 26/4/2021, publicado no DJE: 5/5/2021. Pág.: Sem Página Cadastrada.) a parte ré, diante da informação do consumidor de que o seu produto apresentava um defeito na tela, após o prazo de garantia contratual, optou por ofertar um aparelho novo àquele consumidor, enquanto que após cerca de um mês do seu recebimento o aparelho celular novo disponibilizado foi bloqueado por uma ?operadora estrangeira?, impedindo o seu funcionamento, sendo que naquele caso esta E. Turma Recursal admitiu a incidência do CDC ao caso concreto. Desse modo, é possível apurar que o acórdão paradigma aborda fatos similares à da situação em análise, com a diferença de que, no presente caso, a parte ré se comprometeu dentro do prazo de garantia contratual a entregar um aparelho novo para a parte autora (ID 24597246), o que não o fez. Portanto, ao admitir dentro da garantia contratual que a parte autora deveria receber um aparelho novo, mas não efetuando a sua entrega até este momento, constata-se que há distinção no caso concreto em face da Súmula 8 da TUJ suficiente para admitir a incidência do CDC na situação dos autos, face a necessidade da empresa que se compromete com a substituição do aparelho respeitar a norma consumerista no momento da sua efetivação. X. Assim, prosseguindo quanto ao mérito da demanda, a partir dos fatos apurados é possível concluir que carece de razoabilidade a tese da parte ré de que o documento ID 24597228 aponta que foram efetuadas alterações indevidas por terceiro no aparelho, o que afastaria a sua garantia. Isso porque os autores adquiriram o aparelho ?desbloqueado? e novo na loja oficial da empresa (ID 24597223), e assim que identificaram que não estava funcionando, ao abrirem o aparelho quando retornaram ao Brasil, procuraram a parte ré para a solução do problema. Portanto, o produto recém adquirido estava na garantia, não existindo razoabilidade na tese de que o consumidor teria buscado uma solução junto a terceiros quando adquiriu um aparelho que não estava funcionando. Ademais, as peculiaridades do caso concreto demonstram que a própria parte ré estava com dificuldades para entender o que teria acontecido, inclusive levando o caso para análise perante os especialistas nos Estados Unidos, uma vez que o aparelho novo veio bloqueado e vinculado a conta de terceiro, além de identificar peças soltas e um novo bloqueio do produto mediante vínculo com uma conta chinesa. Os elementos permitem atestar que ocorreu algum problema na origem do produto vendido ao consumidor como ?novo?, sendo alguma fraude ou falha no processo de produção, o que não pode ser atribuído ao consumidor. Portanto, não deve prosperar a tese de descumprimento dos termos de garantia, uma vez que o produto ?novo? adquirido jamais funcionou, apresentando problemas de fabricação dentro do prazo de garantia fornecido, com a promessa não cumprida pela empresa de que entregaria um aparelho novo. Assim, mantém-se a reparação material fixada na sentença, não existindo insurgência recursal quanto ao valor daquela condenação. XI. Não se desconhece que a mera existência de defeito no aparelho novo não enseja, por si só, a condenação por danos morais. Todavia, no caso concreto, foi realizada a aquisição de aparelho celular com valor significativo (na ocasião dos fatos o aparelho era o segundo modelo mais caro disponibilizado para venda pela parte ré - Apple), que apresentava defeito no processo de produção, vinculado a uma conta na China e com peças soltas. Contudo, após meses de tentativas de solução da questão a parte ré informou que efetuaria a troca (ID 24597246), o que jamais ocorreu. Constata-se evidente descaso da parte ré, que após meses sem solucionar o caso, e diante de dúvidas quanto ao que poderia ter ocorrido com o aparelho, não adotou qualquer medida eficaz para a solução do problema, apenas uma promessa não concretizada de troca do produto, além de manter o aparelho anterior consigo. A situação da parte consumidora, que atualmente completou dois anos da aquisição de um aparelho celular sofisticado sem que jamais tenha conseguido utilizá-lo, permanecendo na dependência da parte ré, acarreta significativo transtorno e abalo, o que suplanta o mero aborrecimento para ingressar e interferir de forma intensa na dignidade da pessoa humana. Assim, confirma-se a existência do abalo moral. XII. A indenização por danos morais possui três finalidades, quais sejam, a prestação pecuniária serve como meio de compensação pelos constrangimentos, aborrecimentos e humilhações experimentados pela parte requerente, punição para a parte requerida e prevenção futura quanto a fatos semelhantes. XIII. Não há um critério matemático ou padronizado para estabelecer o montante pecuniário devido à reparação. O valor da reparação deve guardar correspondência com o gravame sofrido, devendo o juiz pautar-se nos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, sopesando as circunstâncias do fato e as condições pessoais e econômicas das partes envolvidas, assim como o grau da ofensa moral e sua repercussão. XIV. Atento às diretrizes acima elencadas, entendo o montante de R$ 2.000,00 (dois mil reais), como suficiente para, com razoabilidade e proporcionalidade, compensar os danos sofridos, sem, contudo, implicar em enriquecimento sem causa. XV. Recurso conhecido. Preliminar rejeitada e não provido. Sentença mantida. Condeno a parte recorrente vencida ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios que fixo em 10% do valor da condenação. XVI. A súmula de julgamento servirá de acórdão, consoante disposto no artigo 46 da Lei nº 9.099/95. 
Decisão:
RECURSO CONHECIDO. PRELIMINAR REJEITADA E NÃO PROVIDO. UNÂNIME.
Termos Auxiliares à Pesquisa:
1
Jurisprudência em Temas:
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Inteiro Teor:
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