APELAÇÃO CÍVEL. ORDEM DEMOLITÓRIA. AGEFIS. CONSTRUÇÃO IRREGULAR. ABUSO DE PODER DO EXERCÍCIO DA AUTOTUTELA. OFENSA AOS PRINCÍPIOS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL, DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA.
1. Na presente hipótese, a autora pretende impor à AGEFIS ordem judicial de abstenção relativa à demolição das acessões físicas erigidas em imóvel pertencente à TERRACAP, localizado na Quadra 307, conjunto 19, Lote 23, Recanto das Emas-DF.
2. No exercício de seu poder de império, a Administração Pública deverá coibir edificações irregulares, adotando as medidas previstas no art. 178, § 1º, da Lei n.º 2.105/1998.
3. As demolições determinadas pela AGEFIS, no entanto, não têm ocorrido somente nos casos de risco à coletividade ou em situações urgência, nem mesmo apenas nos casos de atuação imediata nas hipóteses de parcelamento irregular de terras públicas. Ao contrário, a aludida autarquia tem promovido também a demolição de construções irregulares, ao atuar inclusive em imóveis residenciais construídos há vários anos, de forma abrupta e imediata, sem promover a notificação dos eventuais interessados, em evidente afronta ao princípio do devido processo legal administrativo, (art. 5º, inc. LIV, da Constituição Federal e artigos 2º, parágrafo único, incisos VIII e IX, e 3º, incisos II e III, da Lei nº 9.784/1999 - Lei do Processo Administrativo). Essa situação, por certo, contraria os direitos fundamentais dos ocupantes, que sequer têm oportunidade de apresentar defesa prévia com o objetivo de suscitar as questões que eventualmente salvaguardam o direito à moradia, em seus diversos matizes bem como para resguardar a própria inviolabilidade residencial.
4. A aplicação do comando normativo previsto no art. 178 da Lei local nº 2105/1998, portanto, deverá, em uma dimensão sistêmica, observar as mencionadas garantias constitucionais, sendo imperativa e obrigatória nos casos em que, a despeito de tratar-se de bem público, seja de natureza dominical, não situado em área de proteção ambiental e não subsista situação de urgência ou qualquer outro motivo fundado na defesa de interesse público primário ou mesmo fundamentado em risco à incolumidade pública ou, finalmente, em situação de flagrância no cometimento de parcelamento irregular do solo.
5. Recurso conhecido e provido.
(
Acórdão 1187563, 20170110428863APC, Relator(a): MARIA DE LOURDES ABREU, , Relator(a) Designado(a):ALVARO CIARLINI 3ª TURMA CÍVEL, data de julgamento: 10/7/2019, publicado no DJE: 26/7/2019. Pág.: 219/223)