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Classe do Processo:
20140111857975APC - (0046929-34.2014.8.07.0001 - Res. 65 CNJ)
Registro do Acórdão Número:
1099375
Data de Julgamento:
16/05/2018
Órgão Julgador:
6ª TURMA CÍVEL
Relator:
ALFEU MACHADO
Data da Intimação ou da Publicação:
Publicado no DJE : 29/05/2018 . Pág.: 468/515
Ementa:

CONSUMIDOR. CIVIL. PROCESSUAL CIVIL.AÇÃO COMPENSATÓRIA POR DANOS MORAIS. INSTITUIÇÃO DE ENSINO. ALUNO, À ÉPOCA COM 6 ANOS, EXPOSTO PELA PROFESSORA A TRATAMENTO DISCIPLINAR DESARRAZOADO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DA ESCOLA FRANCESA. PRESSUPOSTOS PRESENTES. DANO MORAL EM RELAÇÃO AO MENOR E AOS PAIS. CONFIGURAÇÃO. QUANTIFICAÇÃO. OBEDIÊNCIA AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. RECURSO DA RÉ DESPROVIDO. RECURSO ADESIVO DOS AUTORES PARCIALMENTE PROVIDO. SENTENÇA REFORMADA EM PARTE. SUCUMBÊNCIA REDISTRIBUÍDA. HONORÁRIOS RECURSAIS FIXADOS.



1. Segundo o Enunciado Administrativo n. 3 do STJ, aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016), como é o caso dos autos, devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC. Nessa situação, por força do Enunciado Administrativo n. 7 do STJ, é possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, com base no art. 85, § 11, do CPC/15.



2. A controvérsia cinge-se a presença ou não dos pressupostos da responsabilidade civil da escola francesa ré, tendo em vista as alegações dos autores de que o 3º requerente, aluno da aludida instituição, à época com 6 anos de idade, fora submetido a situação constrangedora em sala de aula por ato de sua professora, sofrendo discriminação dos pais e alunos após a disseminação de boatos de que "explodiria a escola", inclusive com denúncia anônima perante o Conselho Tutelar, para fins de pagamento de danos morais ao menor e aos genitores.



3. A responsabilidade civil dos fornecedores de serviços, a cujo conceito se amolda a instituição de ensino ré, é objetiva, fundada no risco da atividade desenvolvida (CDC, arts. 2º, 3º, 14 e 17; CC, arts. 186, 187, 927, 932, III, e 933), não se fazendo necessário perquirir acerca da existência de culpa.Em tais casos, basta a comprovação do liame de causalidade entre o defeito do serviço e o evento danoso experimentado pelo consumidor, cuja responsabilidade somente poderá ser afastada/minorada nas hipóteses de caso fortuito/força maior (CC, art. 393), inexistência do defeito (CDC, art. 14, § 3º, I) e culpa exclusiva do ofendido ou de terceiros (CDC, art. 14, § 3º, II).



4. Pela documentação dos autos, sobressai evidente que o 3º autor, à época com 6 anos de idade, aluno da instituição de ensino ré, foi submetido a situação constrangedora em sala de aula por ato de sua professora, a qual, após flagrar alunos molhando o chão da classe, determinou que tão somente aquele limpasse a sujeira que havia sido feita. Também é de se observar que, em razão da situação, o menor teria comunicado aos colegas a vontade de "explodir a escola", o que provocou a comoção de alguns pais de alunos e a realização de denúncia anônima perante o Conselho Tutelar, via e-mail, posteriormente arquivada.



5. Sobre a situação, a escola ré, em sua contestação, expressamente entendeu por equivocada a atitude da docente ao mandar que o 3º autor secasse o chão da sala, pois, na qualidade de autoridade disciplinar, deveria ter retirado o aluno de classe e comunicado o fato à diretoria para que esta decidisse sobre qual penalidade (suspensão/advertência) seria aplicada a ele e entrasse em contato com os pais. Inclusive, consignou que, em razão da falha da professora, a diretoria aplicou-lhe uma penalidade de advertência.



6. Não obstante o professor em sala de aula seja detentor da autoridade disciplinar necessária ao exercício da elevação educacional, cultural e de conduta do aluno no ambiente coletivo em que está inserido, o ato da docente, ao determinar que o 3º autor limpasse o chão, não foi adequado, pois, ainda que pretendesse corrigir o aluno, impôs-lhe um castigo exagerado na frente de toda a classe, notadamente por se tratar de uma criança de 6 anos de idade. Ainda que a ré tenha sustentado que tal repreensão serviria de barreira para evitar casos similares, fato é que a conduta imposta ao aluno foi desarrazoada, expondo-o a constrangimento perante a turma. É no mínimo inusitado que uma criança de apenas 6 anos participe da travessura em sala de aula e que, mesmo após insistir que não praticou o ato sozinha, fosse a única punida, gerando um verdadeiro sentimento de discriminação. Mesmo porque, há formas mais brandas de se chamar a atenção da criança. Tal episódio acarretou insatisfação no menor a ponto de afirmar que "explodiria a escola", tudo para não precisar retornar ao local.



7. Mesmo dispondo de um serviço de orientação educacional para os alunos, o 3º autor não foi encaminhado de imediato, o que, por óbvio, poderia minimizar as consequências da situação, tampouco os pais do aluno (1º e 2º autores) foram acionados tempestivamente sobre o acontecido.



8. Desse modo, tem-se por configurada a conduta ilícita e o nexo causal, considerando a atuação desproporcional da professora e a responsabilidade da instituição de ensino ré em assegurar ao aluno o correto tratamento disciplinar enquanto estava sob sua custódia, respondendo pelos danos causados.



9. Não há nos autos prova da violência física perpetrada pela professora, consistente no arremesso de uma bola de papel completamente molhada e suja no rosto do aluno enquanto este limpava o chão. Com relação aos boatos desabonadores que circulavam entre os pais e alunos, tendo em vista a ameaça do 3º autor de "explodir a escola", que ensejou denúncia anônima no Conselho Tutelar, também não é possível imputá-los à instituição escolar. Logo, não há falar em ampliação do ato ilícito.



10. O dano moral se relaciona diretamente com os prejuízos ocasionados a direitos da personalidade, cuja violação afeta diretamente à dignidade do indivíduo e constitui motivação suficiente para fundamentar uma ação compensatória dessa natureza (CF, art. 5º, V e X; CDC, art. 6º, VI). Em certos casos, embora o evento danoso tenha afetado determinada pessoa, seus efeitos podem atingir, indiretamente, a integridade moral de terceiros (préjudice d'affection). É o que se chama de danos morais reflexos ou por ricochete.



10.1. O constrangimento sofrido pelo 3º autor perante seus colegas de classe, necessitando limpar o chão por ordem de sua professora, ultrapassa a esfera do mero dissabor e configura abalo moral, notadamente por se tratar de criança (6 anos de idade à época). Tanto é verdade que, após o evento, o menor passou a se sentir insatisfeito com a escola, afirmando, na imaginação de um ser ainda em desenvolvimento, que pretendia "explodi-la", o que, em momento posterior, desencadeou uma denúncia anônima infundada perante o Conselho Tutelar. Ou seja, depreende-se que a correção importa pela professora à criança, no contexto, modo e local, foi extremamente severa, ao ponto de incutir temores e sentimento de raiva, configurando violação a direitos da personalidade.



10.2. No tocante aos genitores do aluno ofendido (1º e 2º autores), pelas regras de experiência comum (CPC/15, art. 375; CPC/73, art. 335), é inegável o sofrimento experimentado em razão da situação humilhante passada por seu filho e do descaso do colégio, que não tomou providências para minimizar as consequências da atuação da professora, provocando sentimento de dor, de impotência e instabilidade emocional, notadamente quando se leva em consideração a confiança depositada no estabelecimento escolar. Por isso,reputa-se configurado o dano moral em relação a eles, embora não na mesma proporção que o do principal ofendido (3º autor).



11. A quantificação dos danos morais deve obedecer a critérios de razoabilidade e proporcionalidade, levando-se em conta, além da necessidade de compensação dos danos sofridos, as circunstâncias do caso, a gravidade do prejuízo, a situação do ofensor e a prevenção de comportamentos futuros análogos (função preventivo-pedagógica-reparadora-punitiva). Normativa da efetiva extensão do dano (CC, art. 944). Nesse passo, levando em conta a situação dos autos, razoável a fixação do valor dos danos morais em relação aos genitores (1º e 2º autores) em R$ 5.000,00 para cada, bem como a manutenção do valor arbitrado em relação ao 3º autor (aluno), de R$ 15.000,00.



12. Oprovimento parcial do recurso adesivo dos autores importa emredistribuição da sucumbência, determinando que a verba honorária seja fixada na Instância recursal, independentemente do valor arbitrado na sentença. Tópico recursal da ré referente à distribuição da sucumbência prejudicado.



13. Recursos conhecidos. Apelo da ré desprovido. Apelo adesivo dos autores provido em parte quanto à configuração do dano moral em relação aos dois primeiros autores. Sucumbência redistribuída. Honorários recursais fixados.
Decisão:
RECURSO DA ASSOCIACAO DE PAIS DE ALUNOS DO LYCÉE FRANÇAIS FRANÇOIS MITTERRAND CONHECIDO E DESPROVIDO. RECURSO DE RUI LOPES SIQUEIRA E OUTROS CONHECIDO PARCIALMENTE PROVIDO, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR. UNÂNIME.
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