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Classe do Processo:
20140110643156APC - (0015396-57.2014.8.07.0001 - Res. 65 CNJ)
Registro do Acórdão Número:
928717
Data de Julgamento:
24/02/2016
Órgão Julgador:
2ª TURMA CÍVEL
Relator:
MARIO-ZAM BELMIRO
Relator Designado:
JOÃO EGMONT
Revisor:
JOÃO EGMONT
Data da Intimação ou da Publicação:
Publicado no DJE : 01/04/2016 . Pág.: 265/272
Ementa:

DIREITO CIVIL, DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. DUPLA APELAÇÃO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PRELIMINARES DE ILEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO E NULIDADE DA SENTENÇA. REJEIÇÃO. REVISÃO DE CLÁUSULAS INSERIDAS EM CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. CLAÚSULA MANDATO. VINCULAÇÃO PUBLICITÁRIA. RESPONSABILIDADE PELO PAGAMENTO DE DESPESAS JUDICIAIS E EXTRAJUDICIAIS. CLÁUSULA PENAL. RETENÇÃO DE 90% (NOVENTA POR CENTO) DO VALOR PAGO. ABUSIVIDADE. LIMITAÇÃO A 10% (DEZ POR CENTO). NOTIFICAÇÃO POR E-MAIL. VENCIMENTO ANTECIPADO. NORMA ESPECÍFICA. LEI Nº 4.864/65, 1º, VI. CASO FORTUITO E FORÇA MAIOR. ATIVIDADE FIM CONSTRUTORA. NÃO CONFIGURAÇÃO. DIFERENÇA NA METRAGEM. RESSARCIMENTO. FIXAÇÃO DE LOGOTIPO DA VENDEDORA. VIABILIDADE. CESSÃO DE DIREITOS. ANUÊNCIA DA VENDEDORA. POSSIBILIDADE. DANOS MORAIS COLETIVOS. CONFIGURAÇÃO. QUANTUM INDENIZATÓRIO. LIMITAÇÃO TERRITORIAL DA COISA JULGADA. REPETIÇÃO DE INDÉBITO EM DOBRO. AUSÊNCIA DE DOLO OU MÁ-FÉ. RECURSOS PARCIALMENTE PROVIDOS.

1. O Ministério Público tem legitimidade para ajuizar ação civil pública na defesa de direitos coletivos relativos ao Direito do Consumidor. 1.1. Quer dizer: "DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVOS REGIMENTAIS NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DIREITOS DISPONÍVEIS. INTERESSE SOCIAL. LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO. 1. Na linha dos precedentes desta Corte, o Ministério Público tem legitimidade para defender direitos individuais homogêneos quando tais direitos revelem uma dimensão social que coincida com o interesse público. 2. Tal legitimidade ainda mais se impõe quando a causa também afeta direitos difusos e coletivos em sentido estrito. 3. No caso dos autos, discute-se a existência de publicidade enganosa e a abusividade de cláusulas de contrato padrão de promessa de compra e venda firmado com consumidores adquirentes de unidades de conjunto habitacional. Transparece, nesses termos, a existência de direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos com forte apelo social a conferir legitimidade ao Ministério Público para a propositura da ação civil pública [...]".(STJ, 4ª Turma, Ag.Rg. no REsp. nº 1.038.389/MS, rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, DJe de 2/12/2014).

2. Afasta-se a preliminar de nulidade de sentença proferida em ação civil pública, sob o argumento de impossibilidade de condenação em pedido genérico, haja vista o requerimento genérico é ínsito à ação coletiva, porquanto busca tutelar o interesse de uma coletividade. 2.1. Ao demais, o fato de o pedido ser genérico, por si só, não induz sua rejeição, quando permite a correta compreensão de seu alcance e não compromete o exercício do contraditório e da ampla defesa da parte contrária, especialmente no caso de como acontece no caso concreto. 2.1 Em uma palavra:"a ação coletiva exige que o pedido mediato seja formulado de forma genérica" (STJ, 3ª Turma, REsp. nº 681.872/RS, relª. Minª. Nancy Andrighi, DJ de 23/5/2005, p. 287).

3. A inserção de "cláusula-mandato", em contrato de promessa de compra e venda de imóvel, pela qual a vendedora outorga poderes, a si própria, para realizar negócios jurídicos em nome do adquirente do imóvel, na condição de procuradora, constitui vantagem desmedida e excessiva em favor da vendedoraque em nada, ou quase nada, aproveita ao consumidor, com nítida violação ao disposto no artigo 51, VIII, do CDC. 3.1. Precedente da Casa: "CIVIL E PROCESSO CIVIL. ENCOL. COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. RELAÇÃO DE CONSUMO. TOMADA DE EMPRÉSTIMO JUNTO A BANCO. ONERAÇÃO DAS UNIDADES ADQUIRIDAS. CLÁUSULA MANDATO. ABUSIVIDADE. INCIDÊNCIA DO CDC. (...) 2. A inserção de cláusula, no contrato, permissiva de oneração (hipoteca) futura do bem adquirido, encerra abusividade com a qual o direito não deve compactuar (...)". (3ª Turma, APC nº 1998.01.1.042710-6, rel. Des. Silvânio Barbosa dos Santos, DJU de 1º/3/2005, p. 127).

4. Ofende as regras da norma consumeirista adisposição contratual que afasta a vinculação publicitária decorrente da propaganda divulgada pela vendedora, haja vista que ofende os princípios da boa-fé objetiva e da transparência. 4.1. O artigo 30 do CDC dispõe que "toda informação ou publicidade, suficientemente precisa, veiculada por qualquer forma ou meio de comunicação com relação a produtos e serviços oferecidos ou apresentados, obriga o fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar e integra o contrato que vier a ser celebrado". 4.1. Quer dizer: "1. O direito à informação, no Código de Defesa do Consumidor, é corolário das normas intervencionistas ligadas à função social e à boa-fé, em razão das quais a liberdade de contratar assume novel feição, impondo a necessidade de transparência em todas as fases da contratação: o momento pré-contratual, o de formação e o de execução do contrato e até mesmo o momento pós-contratual. 2. O princípio da vinculação da publicidade reflete a imposição da transparência e da boa-fé nos métodos comerciais, na publicidade e nos contratos, de modo que o fornecedor de produtos ou serviços obriga-se nos exatos termos da publicidade veiculada, sendo certo que essa vinculação estende-se também às informações prestadas por funcionários ou representantes do fornecedor. 3. Se a informação se refere a dado essencial capaz de onerar o consumidor ou restringir seus direitos, deve integrar o próprio anúncio, de forma precisa, clara e ostensiva, nos termos do art. 31 do CDC, sob pena de configurar publicidade enganosa por omissão (...)". (STJ, 4ª Turma, REsp. nº 1.188.442/RJ, rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJe de 5/2/2013).

5. É nula a cláusula contratual que imputa ao promitente comprador, no caso de purgação da mora, a responsabilidade pelas despesas judiciais e extrajudiciais decorrentes do atraso, bem como o pagamento de honorários advocatícios no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor do débito, pois que não assegura ao adquirente a reciprocidade da estipulação (CDC, 51, XII). 5.1. Precedente da Corte: "APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. REVISIONAL DE CONTRATO (...) TARIFA DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS EXTRACONTRATUAIS. ILEGALIDADE (...) 3. É nula de pleno direito a cláusula que estipula a cobrança de honorários advocatícios extrajudicias, no caso de inadimplência, nos termos do art. 51, XII, do CDC (...)". (1ª Turma Cível, APC nº 2011.04.1.011564-8, relª. Desª. Simone Lucindo, DJe de 21/3/2013, p. 56).

6. A retenção, pela construtora, de até 90% (noventa por cento) do valor total pago pelo consumidor afigura-se flagrantemente abusiva e despropositada, nos termos do artigo 51, VI c/c artigo 53, do CDC, sendo razoável a redução para 10% (dez por cento). 6.1. Precedente da Casa: "O percentual de 15% (quinze por cento) sobre o valor atualizado do contrato, a título de retenção por rescisão contratual a pedidodo comprador, mostra-se abusivo, no caso concreto, afigurando-se razoável a aplicação do percentual de 10% sobre os valores efetivamente desembolsados pelo promitente comprador, para se evitar o enriquecimento ilícito de uma das partes, haja vista que, com a resilição contratual, elas devem voltar ao status quo ante (...)".(2ª Turma Cível, APC nº 2013.01.1.182852-6, relª. Desª. Leila Arlanch, DJe de 26/3/2015, p. 177).

7. Conquanto não se olvide, de um lado, que na sociedade hodierna os meios eletrônicos são bastante difundidos e utilizados para a prática dos mais variados atos; de outro lado, porém, também não pode deixar em oblívio que, no âmbito dos negócios jurídicos, a notificação constitui ato solene de uma manifestação de vontade, utilizada, a rigor, como meio de cientificar um sujeito de direito para que pratique ou não determinado ato, sob pena de alguma cominação. 7.1. Revela-se, pois, temerário considerar que o envio de simples correspondência eletrônica (e-mail), pouco importando que seja recebida, possa ser atribuída a certeza de conhecimento do consumidor sobre do desfazimento do negócio jurídico, máxime diante da repercussão daí decorrente, que segundo a indigitada previsão contratual poderá implicar até mesmo alienação do bem sem que os promitentes compradores possam "alegar posse ou retenção de qualquer natureza". Inteligência do artigo 6º, I e III, do CDC.

8. O dispositivo contratual prevendo acerca do vencimento antecipado da obrigação, em caso de atraso no pagamento de 2 (duas) parcelas consecutivas ou não, está em descompasso com a legislação aplicável à espécie, porquanto o artigo 1º, VI, da Lei nº 4.864/65 preceitua que tal providência só terá lugar quando o inadimplemento se referir a, no mínimo, 3 (três) prestações, sendo certo quea previsão negocial não pode sobrepor-se à lei.

9. Não se considera caso fortuito ou motivo de força maior, aptos a justificar a ampliação do prazo para entrega do imóvel, os eventos que possuem íntima relação de pertinência com os riscos ordinários da atividade desempenhada pela construtora, tais como greves, escassez de mão de obra e/ou materiais. 9.1. Cumpre recordar que se entende como caso fortuito aquele fato que não poderia razoavelmente ser evitado ou previsto, decorrente de forças naturais ou ininteligíveis, tais como um terremoto, um furacão, etc.; e por força maior o fato de terceiros que cria, para a execução da obrigação, um obstáculo intransponível, tal como uma guerra. Valendo destacar a ressalva contida no parágrafo único do artigo 393 do Código Civil de que "o caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir". 9.2. "INDENIZAÇÃO. CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL RESIDENCIAL EM CONSTRUÇÃO. PRAZO DE ENTREGA. CASO FORTUITO OU FORÇA MAIOR. MORA DA INCORPORADORA. LUCROS CESSANTES. I - A suposta escassez de mão-de-obra e de insumos utilizados no setor da construção civil, bem como a eventual demora da CEB na aprovação dos projetos elétricos do empreendimento, não se caracterizam como caso fortuito ou força maior, sendo que, para lidar com tais situações, a Incorporadora-ré dispôs do prazo de tolerância de 180 dias úteis para a conclusão da obra. II -Diante do atraso injustificado na entrega do imóvel, são devidos lucros cessantes ao comprador, desde o término do prazo de tolerância de 180 dias úteis até a efetiva entrega das chaves, não se justificando o pagamento proporcional em razão da ausência de quitação do preço. III - Apelação desprovida".(TJDFT, 6ª Turma Cível, APC nº 2013.03.1.026121-7, relª. Desª. Vera Andrighi, DJe de 24/6/2014, p. 388).

10. Considera-se abusiva previsão contratual acerca do não ressarcimento aos compradores no caso de existência de diferença entre a área do terreno ou de utilização privativa do imóvel e a constante do projeto aprovado. 10.1. Precedente da Corte: "Demonstrada a existência de diferença de metragem da área do imóvel inferior a da efetivamente contratada, impõe-se o abatimento do preço, de forma proporcional, a fim de coibir-se o enriquecimento ilícito de uma parte, em detrimento da outra, com fundamento no art. 500 do Código Civil". (5ª Turma Cível, APC nº 2012.01.1.029326-4, rel. Des. Sebastião Coelho, DJe de 4/7/2014, p. 153).

11. Embora a cláusula contratual que autoriza a instalação, por um prazo de 10 (dez) anos, em áreas externas ou internas do empreendimento, logotipos ou outros sinais indicativos dos nomes e atividades empresariais da vendedora imponha publicidade gratuita, seu conteúdo, por si só, não acarreta, de plano, prejuízo aos consumidores, sem embargo de que qualquer dano decorrente venha a ser objeto de ação própria.

12. É válida a cláusula contratual que condiciona a cessão, a transferência ou alienação de imóvel objeto de promessa de compra e venda, à anuência da vendedora, pois que não se configura, de plano, estipulação meramente potestativa ou abusiva (CC, 286). 12.1. Tal não impede, porém, a análise de casos tópicos pelo Poder Judiciário, sendo possível que em determinadas circunstâncias a recusa imotivada de anuência configure abuso de direito.

13. É possível o reconhecimento de dano moral coletivo, que constitui a lesão na esfera moral de uma comunidade, caracterizada pela ofensa aos seus valores, do ponto de vista jurídico, que não se resume apenas à existência de prejuízo de ordem psicológica, mas qualquer abalo negativo à moral da coletividade. 13.1. O Egrégio Superior Tribunal de Justiça, já consignou que "a jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido do cabimento da condenação por danos morais coletivos em sede de ação civil pública". (2ª Turma, Ag.Rg. no REsp. nº 1.526.946/RN, rel. Min. Humberto Martins, DJe de 24/9/2015). 13.2. Levando em conta que o valor arbitrado, no caso concreto - R$ 600.000,00 (seiscentos mil reais) - foi levado a efeito em observância aos critérios de proporcionalidade e razoabilidade, não podendo transcender sua essência, isto é, ser insignificante a ponto de não atender sua função pedagógica/punitiva, tampouco ser exorbitante de modo a subverter seu caráter compensatório, tornando-se, fonte de enriquecimento sem causa à parte.

14. Aeficácia da sentença proferida em ação coletiva alcança todos os consumidores que estão sujeitos às mesmas condições, segundo a extensão do dano e a qualidade dos interesses dispostos em juízo, até mesmo com vistas a evitar a proliferação de ações individuais e homenageando os princípio da economia e celeridade processual e efetividade do processo. 14.1. Precedente do STJ: "PROCESSO CIVIL E DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. AGRAVO REGIMENTAL. CONTRATOS DE SEGURO DE VIDA. APLICAÇÃO DO CDC. SÚMULA 83 DO STJ. ALCANCE OBJETIVO E SUBJETIVO DOS EFEITOS DA SENTENÇA COLETIVA. LIMITAÇÃO TERRITORIAL. IMPROPRIEDADE. MATÉRIA PACIFICADA EM SEDE DE RECURSO REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA (...) 2. A sentença proferida em ação civil pública versando direitos individuais homogêneos em relação consumerista faz coisa julgada erga omnes, beneficiando todas as vítimas e seus sucessores, uma vez que "os efeitos e a eficácia da sentença não estão circunscritos a lindes geográficos, mas aos limites objetivos e subjetivos do que foi decidido, levando-se em conta, para tanto, sempre a extensão do dano e a qualidade dos interesses metaindividuais postos em juízo (arts. 468, 472 e 474, CPC e 93 e 103, CDC)." (REsp 1243887/PR, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Corte Especial, julgado sob a sistemática prevista no art. 543-C do CPC, em 19/10/2011, DJe 12/12/2011) 3. Agravos regimentais não providos". (4ª Turma, Ag.Rg. no REsp. nº 1.094.116/DF, rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJe de 27/5/2013)

15. À míngua de qualquer elemento que evidencie a existência de dolo ou má-fé da construtora na elaboração de cláusulas contratuais insertas em promessa de compra e venda de imóvel, mesmo que se verifique a existência de abusividade em algumas estipulações, esta circunstância, por si só, não evidencia a intenção da vendedora de prejudicar deliberadamente o consumidor, razão pela qual eventual repetição de indébito deve ser realizada na forma simples.

16. Apelações conhecidas e parcialmente providas.
Decisão:
DAR PARCIAL PROVIMENTO A AMBOS OS RECURSOS NOS TERMOS DO VOTO DO E. REVISOR, QUE REDIGIRÁ O ACORDÃO
Termos Auxiliares à Pesquisa:
SÚMULA 308 DO STJ, RECURSO REPETITIVO, REPETIÇÃO DO INDÉBITO EM DOBRO, NOTIFICAÇÃO POR CORREIO ELETRÔNICO, EFICÁCIA DA SENTENÇA, TERRITÓRIO NACIONAL.
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