APELAÇÃO CRIMINAL. ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR PRATICADO CONTRA ENTEADA. SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA. PRELIMINAR DE INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA. REJEITADA. MÉRITO. DESCLASSIFICAÇÃO PARA A CONTRAVENÇÃO DE PERTURBAÇÃO À TRANQUILIDADE. INVIÁVEL. DOSIMETRIA. APLICAÇÃO DA CAUSA DE AUMENTO VIGENTE AO TEMPO DA CONDUTA. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
1. Os dispositivos da Lei nº 11.340/2006 (Lei Maria da Penha) possuem natureza mista, motivo pelo qual sua aplicabilidade fica restrita aos delitos posteriores à vigência do referido diploma normativo, na medida em que são mais penosos ao autor do crime. Por via de consequência, fica afastada a competência do Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher aos delitos cometidos antes da entrada em vigor da Lei.
2. O arcabouço probatório coligido aos autos mostra-se uníssono, estando a palavra da vítima revestida de especial valor probante, sobretudo porque em total harmonia com os demais elementos colhidos no bojo da instrução, formando um conjunto probatório suficientemente hábil a fundamentar o decreto condenatório.
3. A tese de desclassificação da conduta do apelante para a contravenção de perturbação da tranquilidade não merece guarida. As condutas do recorrente consistiram em atos realmente lascivos, demonstrando que sua intenção não era a de apenas gerar mera perturbação ou incômodo à vítima. O réu foi além do simples toque, tendo realizado diversos atos que demonstram intensa lascívia: obrigando-a a se despir, chupando os seus seios, acariciando a vagina por longo período de tempo, ou, ainda, introduzindo o dedo no órgão genital dela.
4. A norma penal é irretroativa, salvo para beneficiar o réu. Aos crimes contra a dignidade sexual praticados entre 1999 a 2004 são inaplicáveis as Leis nos. 12.015/09 (institui o artigo 217-A, estupro de vulnerável) e 11.106/05 (aumentou na metade o crime praticado por ascendente contra enteada), por serem diplomas normativos posteriores à prática delitiva e mais gravosos ao apelante.
5. A jurisprudência desta egrégia Corte segue orientação doutrinária de que o estado de miserabilidade jurídica do réu, a fim de viabilizar isenção de qualquer consectário legal (v.g. custas processuais), deve ser aferido no juízo da execução.
6. Preliminar rejeitada e recurso parcialmente provido.
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Acórdão 802968, 20050510009247APR, Relator: SILVÂNIO BARBOSA DOS SANTOS, , Revisor: JOÃO TIMÓTEO DE OLIVEIRA, 2ª Turma Criminal, data de julgamento: 10/7/2014, publicado no DJE: 16/7/2014. Pág.: 182)