JUIZADO ESPECIAL CÍVEL. CONSUMIDOR. FRAUDE BANCÁRIA. GOLPE DO FALSO ATENDENTE. TRANSFERÊNCIA PIX MEDIANTE CARTÃO DE CRÉDITO. CULPA CONCORRENTE. DANO MATERIAL PROPORCIONAL. DANO MORAL AFASTADO. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Com apoio do art. 99, § 3º, do Código de Processo Civil, e considerada a prova documental exibida (ID 61095320), defiro a gratuidade de justiça em favor da autora/ recorrente. 2. Trata-se de recurso inominado interposto pela autora, em face da sentença que julgou improcedentes os pedidos iniciais. 3. A autora/recorrente alega que recebeu ligação telefônica da central de atendimento do Banco Nubank e, ante a notícia de fraude mediante a utilização de seu cartão de crédito, seguiu as orientações que recebeu e efetuou transferência via PIX, do valor de R$3.055,92 para terceiros, suspeitando da aplicação de golpe quando inquirida sobre o seu limite bancário para empréstimo. Sustenta que a fraude foi perpetrada porque a instituição financeira permitiu o vazamento de seus dados pessoais e sigilosos. Pugna pela declaração de inexistência do pagamento efetuado, por meio PIX, na modalidade crédito, no valor de R$3.055,92 (três mil e cinquenta e cinco reais e noventa e dois centavos), e de inexigibilidade do valor e juros decorrentes, além da condenação da ré ao pagamento de danos morais, no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais). 4. Em contrarrazões, a instituição financeira sustenta que não ocorreu falha na prestação do serviço e afasta a sua responsabilidade pelo ocorrido. Requer a manutenção da sentença. 5. A relação é de consumo e as instituições bancárias respondem objetivamente pelos danos causados por vício na prestação de serviços, ressalvada a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiros (art. 14, § 3º, II, do CDC). E a Súmula 479 do STJ assim estabelece: ?As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos causados gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias.?. 6. No caso, é fato incontroverso que em 23/01/024 a autora efetuou transferência via pix, modalidade crédito, no valor de R$3.055,00, em benefício de terceiro. 7. Constata-se que a fraude foi concretizada porque a autora, independentemente de confirmação da legitimidade do contato telefônico, embora amplamente divulgado o modus operandi dos golpes bancários, seguiu os procedimentos recebidos e realizou transferência bancária para terceiro, evidenciando que a falta de confirmação da fidedignidade da informação recebida desencadeou o ilícito. 8. Ademais, não é possível concluir que ocorreu vazamento de dados pessoais e bancários da autora, uma vez que foi noticiada suposta compra de R$900,00 em determinado estabelecimento comercial, de forma genérica e aleatória. 9. Outrossim, embora a usuária não tenha confirmado a fidedignidade da informação recebida, desatenção que desencadeou o ilícito, a situação retrata que também ocorreu falha no dever de segurança do sistema bancário. Com efeito, a autora comunicou o ilícito à instituição financeira de forma imediata e nenhuma providência eficaz foi tomada (ID 61094087), importando destacar que a transferência bancária é destoante do perfil da correntista, que recebe salário mensal de R$2.164,85. Ao contrário das evidências, a transferência irregular não foi detectada ou impedida pelo sistema de segurança da instituição financeira, configurando falha no serviço bancário fornecido. No mesmo sentido: REsp n. 1.995.458/SP, relatora Ministra NANCY ANDRIGHI, Terceira Turma, julgado em 9/8/2022, DJe de 18/8/2022. 10. Nesse contexto, as condutas das partes foram determinantes para a consumação da fraude, hipótese de culpa concorrente da usuária e da instituição financeira, que devem responder igualmente pelo prejuízo sofrido. No mesmo sentido: Acórdão 1756637, Relator: EDI MARIA COUTINHO BIZZI, Terceira Turma Recursal, data de julgamento: 11/9/2023, publicado no DJE: 21/9/2023; Acórdão 1756505, Relator: EDILSON ENEDINO DAS CHAGAS, Primeira Turma Recursal, data de julgamento: 8/9/2023, publicado no PJe: 22/9/2023; Acórdão 1750156, Relator: MARILIA DE AVILA E SILVA SAMPAIO, Segunda Turma Recursal, data de julgamento: 28/8/2023, publicado no DJE: 8/9/2023. 11. Em caso similar, a culpa concorrente em fraudes bancárias foi reconhecida no Enunciado da Súmula 28 da Turma de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais do Distrito Federal, que dispõe: "As instituições financeiras respondem pelos danos decorrentes de fato do serviço nas fraudes bancárias conhecidas como 'golpe do motoboy', em que o consumidor, supondo seguir instruções de preposto do banco, e utilizando-se dos instrumentos de comunicação por ele fornecidos, entrega o cartão de crédito/débito a terceiro fraudador que o utiliza em saques e compras. Em caso de culpa concorrente, a indenização deve ser proporcional.? 12. Por outro lado, a fraude bancária perpetrada, por força da culpa concorrente das partes, afasta a responsabilidade da instituição financeira por eventual dano moral suportado pela autora. 13. Por conseguinte, as partes devem dividir o prejuízo decorrente da transferência de R$3.055,92 e dos respectivos encargos financeiros, por força da culpa concorrente (art. 945 do Código Civil). Precedentes: Acórdãos 1721627, 1721341, 1713808,1705075 e 1662813. 14. RECURSO CONHECIDO. PARCIALMENTE PROVIDO para, em face da natureza da transferência bancária impugnada - PIX mediante cartão de crédito -, declarar a inexigibilidade da metade do prejuízo suportado (R$3.055,92), correspondente a R$1.527,96 (um mil quinhentos e vinte e sete reais e noventa e seis centavos), e dos respectivos encargos financeiros, vedadas novas cobranças decorrentes da mesma operação financeira. 15. Súmula de julgamento servindo de acórdão, na forma do artigo 46 da Lei nº 9.099/95. 16. Nos termos do art. 55 da Lei nº 9.099/95, sem condenação em custas e honorários advocatícios, ante a ausência de recorrente vencido.