JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS. RECURSO INOMINADO. DIREITO DO CONSUMIDOR. AQUISIÇÃO DE PORCELANATO. VÍCIO NO PRODUTO. MANCHAS VISÍVEIS. INSTALAÇÃO REALIZADA. RESOLUÇÃO DO CONTRATO. CABIMENTO. DEVIDA A RESTITUIÇÃO INTEGRAL DOS VALORES PAGOS, INCLUSIVE MÃO DE OBRA. RISCO DA ATIVIDADE PERTENCENTE AO FORNECEDOR. DANO MORAL CONFIGURADO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. I. Trata-se de recurso inominado interposto pela parte autora em face da sentença que julgou improcedentes os pedidos deduzidos na inicial, relativos à substituição de produtos defeituosos (porcelanato), com mão de obra inclusa, além de compensação por danos morais. Em suas razões, o recorrente sustenta que o defeito no produto foi causado por armazenamento indevido, conforme laudo do produto pelo fabricante. Afirma que já recebeu as caixas do produto todas abertas e molhadas. Aduz que não percebeu os vícios antes da instalação, porque o porcelanato se encontrava dentro das caixas. Pede a reforma da sentença. Contrarrazões apresentadas apenas pela fabricante. II. Recurso cabível e tempestivo. Preparo dispensado em razão da gratuidade de justiça ora concedida. Prejudicada a preliminar de deserção. III. No caso dos autos, verifica-se no recurso relação lógica dos argumentos com os fundamentos da sentença vergastada, não se observando violação ao princípio da dialeticidade. Preliminar rejeitada. IV. O Juiz é o destinatário da prova, cabendo indeferir de plano as que se mostram inúteis à solução da demanda ou que sejam meramente protelatórias, art. 370, § único, do CPC. A realização de perícia no caso constitui prova imprestável à solução da demanda, uma vez que é incontroverso nos autos que a causa das manchas apontadas pelo autor foi o vício de armazenamento, tal como indicado pela recorrida em seu laudo técnico. V. Cumpre observar que se aplicam ao caso os ditames do Código de Defesa do Consumidor, pois as partes se enquadram nos conceitos previstos nos arts. 2º e 3º daquele diploma legal. Com efeito, a responsabilidade civil no CDC assenta-se sobre o princípio da qualidade do serviço ou produto, não apresentando a qualidade esperada o serviço que não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, dentre as quais se destacam o modo de prestação do seu fornecimento e o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam (art. 14, § 1º, I e II do CDC). A responsabilidade objetiva do fornecedor em tais casos somente será ilidida se ficarem comprovados os fatos que rompem o nexo causal, ou seja, deve o fornecedor provar que, tendo o serviço sido prestado o defeito inexistiu ou o fato exclusivo do consumidor ou de terceiro. A dicção do § 3º do art. 14 do CDC é muito clara ao criar a inversão ope legis do ônus da prova da inexistência do fato do serviço, ao estabelecer que "o fornecedor do serviço só não será responsabilizado quando provar...". VI. Não obstante a causa do vício no produto tenha sido apontada como decorrente de falhas no armazenamento, o autor recorrente alegou que já recebeu o porcelanato em caixas abertas e molhadas. Nada há nos autos que comprove que foram seguidos pela comerciante os critérios de acondicionamento e armazenamento recomendados pela fabricante, muito menos que tais critérios tenham sido desrespeitados pelo autor, após o recebimento dos produtos. Ao contrário, as fotografias carreadas aos autos, inclusive no laudo técnico produzido pela fabricante, evidenciam que as caixas estavam acondicionadas em local seco e coberto. Não há nos autos nenhum documento assinado pelo recorrente que ateste o recebimento do produto em perfeitas condições. O autor foi diligente em incluir observação no comprovante de recebimento no sentido de que todas as caixas estavam molhadas e violadas, ID 55688889. Assim, diante da ausência de prova de fato de terceiro ou do próprio consumidor, devem os fornecedores responder solidariamente pelos danos decorrentes do vício apresentado pelo produto, nos termos dos arts. 7º e 34 do CDC. VII. O autor formulou pedidos alternativos (substituição do produto ou rescisão do contrato), de modo que, devido a maior facilidade na execução da sentença, a rescisão do contrato e o ressarcimento integral da quantia paga é medida que se impõe, sem prejuízo das perdas e danos, nos termos do art. 18, § 1º, II, do CDC. O valor a ser ressarcido é de R$ 11.648,08 (onze mil seiscentos e quarenta e oito reais e oito centavos), correspondente aos valores despendidos para aquisição do produto e mão de obra de instalação, conforme documentos que acompanham a inicial. VIII. Destaque-se que o fato das manchas serem visíveis não afasta o dever de indenização quanto à mão de obra, uma vez que o risco da atividade pertence ao fornecedor, sendo indevida a tentativa de transferência da responsabilidade ao consumidor quanto à conferência da existência de vícios de qualidade no produto. IX. O dano moral pode ser definido como a privação ou lesão de direito da personalidade, independentemente de repercussão patrimonial direta, desconsiderando-se o mero mal-estar, dissabor ou vicissitude do cotidiano, sendo que a sanção consiste na imposição de uma indenização, cujo valor é fixado judicialmente, com a finalidade de compensar a vítima, punir o infrator e prevenir fatos semelhantes que provocam insegurança jurídica. De acordo com a doutrina e a jurisprudência, o prejuízo imaterial é uma decorrência natural (lógica) da própria violação do direito da personalidade ou da prática do ato ilícito. Assim, o dano moral, de acordo com Sérgio Cavalieri Filho: "deriva inexoravelmente do próprio fato ofensivo, de modo que, provada a ofensa... está demonstrado o dano moral" (Programa de Responsabilidade Civil. 5ª ed. São Paulo: Editora Malheiros. 2003. p. 99). X. No caso dos autos, são inegáveis os transtornos e aborrecimentos que o autor enfrentou e enfrentará para resolver integralmente seu problema, incluindo a retirada e reassentamento de todo o piso de sua casa. Assim, evidente o dano moral. No que se refere ao valor, a quantia de R$ 2.000,00 (dois mil reais) se encontra adequada e proporcional ao contexto dos autos e ao grau de sofrimento vivenciado, sobretudo considerando que grande parte do transtorno poderia ter sido evitado caso o autor tivesse seguido a recomendação existente na caixa do produto quanto à conferência antes da instalação. Portanto, a responsabilidade da ré neste aspecto deve ser atenuada, uma vez que o autor deveria e poderia ter mitigado sua própria perda. XI. Recurso CONHECIDO E PROVIDO para reformar a sentença e julgar procedentes os pedidos iniciais, resolvendo o contrato celebrado entre as partes e condenando as rés, solidariamente, a ressarcirem ao autor o valor de R$ 11.648,08 (onze mil seiscentos e quarenta e oito reais e oito centavos), acrescido de correção monetária pelo INPC a contar do desembolso e de juros de mora de 1% ao mês a contar da citação, além do pagamento de R$ 2.000,00 (dois mil reais) a título de compensação por danos morais. acrescido de correção monetária pelo INPC a contar do arbitramento e de juros de mora de 1% ao mês a contar da citação XII. Sem honorários ante a ausência de recorrente vencido, nos moldes do art. 55 da Lei 9099/95. XIII. A súmula de julgamento servirá de acórdão, consoante disposto no artigo 46 da Lei nº 9.099/95.