APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO. COBRANÇA INDEVIDA DE CONSUMO DE ÁGUA PELA CAESB. RESPONSABILIDADE POR FATO DO SERVIÇO. ÔNUS PROBATÓRIO. INVERSÃO OPE LEGIS. REGULARIDADE DA MEDIÇÃO DA ÁGUA E DA FATURA. NÃO COMPROVAÇÃO. MÉDIA DE CONSUMO NOS MESES ANTERIORES. OBSERVÂNCIA. NECESSIDADE. PROTESTO INDEVIDO. DANO MORAL CONFIGURADO. RECURSO PROVIDO. 1. O fornecimento de água e a prestação de serviços de esgoto estão sujeitos ao Código de Defesa do Consumidor (CDC), conforme previsão dos arts. 4º, VII, 6º, X. Especificamente, o seu art. 22 dispõe que: ?Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos?. 2. O CDC possui duas diferentes preocupações no tocante aos produtos e serviços colocados no mercado de consumo: 1) segurança; e 2) funcionalidade. Como consequência, há, de um lado, disciplina própria denominada responsabilidade pelo fato do produto e do serviço (arts. 8º a 17) e, do outro, a responsabilidade por vício do produto e do serviço (art. 18 a 25). Para o CDC o produto ou serviço possui qualidade quando funciona adequadamente - atende à finalidade que lhe é inerente - e, ao mesmo tempo, não oferece risco à saúde e segurança - inclusive, patrimonial - do consumidor. 3. A cobrança do consumidor de valores indevidos, decorrentes de falha na medição do serviço, caracteriza, em tese, responsabilidade por fato do serviço. Nesta hipótese, há questão processual a ser observada: o ônus da prova das excludentes é sempre do fornecedor. No fato do serviço, o § 3º do art. 14 do CDC, além de indicar hipóteses de exclusão de responsabilidade, estabelece inversão ope legis do ônus da prova. A redação do dispositivo, ao utilizar a expressão ?quando provar?, deixa claro que se trata de ônus do fornecedor a prova relativa à inexistência de defeito e das outras excludentes. O tema não gera divergências. Tanto a doutrina quanto o Superior Tribunal de Justiça entendem que é hipótese de inversão ope legis do ônus da prova. 4. Nos acidentes de consumo, para excluir o dever de indenizar, não basta ao fornecedor alegar ausência de defeito ou outra excludente de responsabilidade: deve produzir prova que demonstre, no caso concreto, a presença da excludente. Na hipótese, a Caesb não se desincumbiu do seu ônus probatório. As circunstâncias fáticas e as provas produzidas indicam que houve falha na medição (desfavorável à consumidora), bem como falha na prestação do serviço. 5. No caso, existe fundada dúvida sobre o regular funcionamento do hidrômetro no mês indicado substituição do hidrômetro, conforme reconhecido pela própria apelada, quanto a existência provável de evento pontual, possivelmente corrigido no mês posterior, o que, em conjunto com a alta na medição destoante e isolada, permite concluir que o valor da fatura deve ser revisto. Assim, deve ser emitida nova fatura para o mês questionado, com valor calculado a partir da média de consumo dos 12 meses anteriores. 6. Em sede doutrinária, há três posições sobre o conceito de dano moral: 1) dor psíquica; 2) violação a direitos da personalidade; e 3) ofensa à cláusula geral da dignidade da pessoa humana. A posição mais adequada combina as duas primeiras correntes. Dano moral decorre de ofensa a direitos da personalidade. Todavia, entre as espécies já reconhecidas dos direitos da personalidade, está o direito à integridade psíquica (dor) cuja violação pode ocorrer de modo isolado ou cumulado com outros direitos existenciais e/ou materiais. 7. No debate sobre dano moral, é importante notar a autonomia do direito à integridade psíquica (dor). A compensação por dano moral pode ser dar unicamente por ofensa ao referido direito sem que isso signifique, necessariamente, adoção da corrente doutrinária que apenas reconhece o dano moral quando há afetação negativa do estado anímico de alguém (dor). 8. No tocante ao valor, na ausência de critérios objetivos, deve o magistrado verificar se houve ofensa a mais de um direito da personalidade e, paralelamente, se pautar nos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, com a compensação do mal injusto experimentado pela vítima. O protesto indevido da fatura implica violação a direitos da personalidade da apelante. Valor fixado em R$ 3.000,00. 9. Recurso conhecido e provido.