CIVIL E CONSUMIDOR. PRELIMINAR RECURSAL. APELO APÓCRIFO. VÍCIO SANADO. PROMESSA DE COMPRA E VENDA. ATRASO NA ENTREGA DO IMÓVEL. EXCLUSÃO DA RESPONSABILIDADE. CASO FORTUITO NÃO CONFIGURADO. CULPA EXCLUSIVA DA PROMITENTE-VENDEDORA. MULTA MORATÓRIA. INVERSÃO CABÍVEL. CUMULAÇÃO COM LUCROS CESSANTES DEVIDA.
1. Caso o recurso interposto seja apócrifo, deve-se, ainda assim, oportunizar, em tempo razoável, ao recorrente a possibilidade de sanear o vício verificado, conforme precedente. 1.1. Uma vez regularizado o defeito destacado no tempo oportuno, deve ser rejeitada a preliminar de inadmissibilidade da peça recursal suscitada pela parte apelada.
2.Arelação jurídica firmada através de contrato de promessa de compra e venda de bem imóvel entre a construtora do empreendimento e o promitente-comprador do imóvel é de consumo, nos termos dos artigos 1º a 3º do CDC.
3. Afasta-se a alegação de excludente da responsabilidade, uma vez que os fatos apontados pela apelante para se qualificar como hipóteses de caso fortuito/força maior ou culpa exclusiva de terceiro são eventos previsíveis e relacionados com a atividade laborativa desenvolvida pela própria construtora, a qual dispõe, inclusive, de prazo de tolerância de 180 (cento e oitenta) dias para conclusão da obra.
4. Acláusula contratual que estabelece que o prazo de entrega do imóvel só teria início após a assinatura do contrato com o agente financeiro é abusiva, na medida em que condiciona o cumprimento de obrigação da apelante à relação estranha ao consumidor-adquirente, ora parte apelada, o que, indubitavelmente, afronta as normas de proteção elencadas pelo Código de Defesa do Consumidor, configurando, pois, prática proibida, nos termos dos incisos I e IV, de seu artigo 51.
5. Pelos princípios da boa-fé e do equilíbrio contratual, mostra-se possível a inversão da multa moratória estipulada somenteem favor de uma das partes, para retificar o desequilíbrio contratual que gera onerosidade excessiva ao consumidor.
6. São devidos os lucros cessantes, haja vista que, diante do comprovado atraso na entrega da obra, a simples impossibilidade de fruição do bem adquirido já é suficiente para gerar o dever de indenizar, haja vista que a parte apelada poderia utilizar o imóvel para moradia própria, poupando-se do ônus de alugar outro bem para tal finalidade, ou, alugá-lo a terceiro, daí auferindo renda mensal, consoante precedente.
7. Aacumulação da multa pelo atraso da entrega do imóvel com a obrigação de pagamento dos lucros cessantes é possível, pois tais institutos possuem naturezas jurídicas diversas, não havendo que se falar em bis in idem. Enquanto os lucros cessantes se prestam a repor as vantagens não auferidas por uma parte devido à mora da outra, a multa contratual almeja penalizar o atraso injustificado do culpado em relação ao cumprimento de sua obrigação.
8. Preliminar de inadmissibilidade do recurso rejeitada; apelação conhecida e não provida.
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Acórdão 935055, 20150710098620APC, Relator(a): GILBERTO PEREIRA DE OLIVEIRA, 3ª TURMA CÍVEL, data de julgamento: 13/4/2016, publicado no DJE: 26/4/2016. Pág.: 248/264)