PROCESSUAL CIVIL, CIVIL E DIREITO DO CONSUMIDOR. CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA. IMÓVEL EM CONSTRUÇÃO. ENTREGA. ATRASO. OBRA INCOMPLETA. DESOBRIGAÇÃO DA CONSUMIDORA EM RECEBÊ-LA. INADIMPLEMENTO CULPOSO DA CONSTRUTORA. CARACTERIZAÇÃO. INDENIZAÇÃO A TÍTULO DE LUCROS CESSANTES. ALUGUERES. QUALIFICAÇÃO. PUBLICIDADE. VINCULAÇÃO. OBRAS DE JARDINAGEM. VINCULAÇÃO AO CONTRATO. COMPREENSÃO DO CONTRATADO. OBRIGAÇÃO NÃO ASSUMIDA NEM INERENTE À ÁLEA ORDINÁRIA DO NEGÓCIO. AUSENCIA DE ASSUNÇÃO DA OBRIGAÇÃO POR PARTE DAS FORNECEDORAS. PEDIDO. EXAMINAÇÃO. DEFERIMENTO. ELUCIDAÇÃO DA CAUSA POSTA EM JUÍZO NA SUA EXATA EXPRESSÃO. JULGAMENTO EXTRA PETITA. EXTRAPOLAÇÃO DOS LIMITES DO PEDIDO. INOCORRÊNCIA. INTERESSE DE AGIR. OBRIGAÇÃO INCONTROVERSA. PERDA DO OBJETO. CARÊNCIA DE AÇÃO. INEXISTÊNCIA.
1. Elucidada estritamente a causa posta em juízo com lastro nas premissas alinhavadas na sentença, derivando na constatação de que a lide fora resolvida na sua exata dimensão, guardando a sentença observância ao princípio da correlação que encontra expressão no artigo 460 do CPC, resta obstado que seja qualificada como extra ou ultra petita, à medida que somente padece desses vícios o provimento judicial que, distanciando-se das balizas impostas à lide pela causa de pedir e pelo pedido, exorbita os lindes firmados, resolvendo questões estranhas ao formulado e chegando a conclusão distinta da almejada pelos litigantes na moldura do devido processo legal.
2. Derivando a pretensão da consumidora da alegação de inadequação do imóvel que lhe fora apresentado para entrega ao pautado pelo contrato de promessa de compra e venda celebrado no pertinente aos acabamentos da obra e extensão do terreno no qual erigida, a constatação de que não restara evidenciado que os vícios imprecados foram corrigidos e ilididos antes ou durante o transcurso da ação pela promitente vendedora resulta na apreensão de que o objeto da lide sobeja incólume, determinando que a pretensão seja resolvida mediante provimento meritório.
4. Conquanto as construtoras tenham veiculado publicidade comercial da unidade imobiliária prometida à venda adornada por jardim derivado de projeto ornamental, a apreensão de que o contrato não incorporara essa prestação, que no próprio folheto publicitário fora assinalado que a imagem usada se tratava de mera perspectiva ilustrativa e que a obra se qualifica como mero acessório de aformoseamento não inerente à álea ordinária do convencionado, notadamente por se tratar de imóvel inserido em programa habitacional governamental, obsta que o veiculado seja assimilado como apto a vincular a promitente vendedora e passe a integrar o convencionado na exata dicção do regramento inserto no artigo 30 do Código de Defesa do Consumidor.
5. A constatação de que, de acordo com o contratado e com as expectativas razoavelmente oriundas das informações pré-contratuais ponderadas com a natureza do imóvel que integrara seu objeto, é impossível se extrair a obrigação de que a alienante assumira a execução de obras de jardinagem e de entregar o imóvel com sua consecução realizada, determina que seja alforriada da obrigação que lhe fora imposta com esse desiderato, à medida que a propaganda e a proposta somente são aptas a vincularem as fornecedoras nos exatos termos da sua difusão, não podendo ser assegurado ao consumidor a fruição de benefício que não lhe é reservado como expressão dos princípios da boa-fé contratual, da vinculação à oferta e da autonomia da vontade (CDC, arts. 6º, II, 37 e 48)
6. As intercorrências inerentes à falta de material da construção civil traduzem fatos inerentes à álea natural das atividades da construtora e incorporadora, pois inteiramente encartadas como fatos inerentes à construção civil, que envolve, obviamente, a regularização das unidades objeto de empreendimento executado sob a forma de incorporação imobiliária, não podendo ser assimiladas como fato fortuito ou força maior passíveis de, traduzindo eventos imprevisíveis, elidirem sua culpa pelo atraso havido na conclusão da unidade que prometera à venda.
7. O atraso injustificado na conclusão e entrega do imóvel em construção prometido à venda traduz inadimplemento contratual culposo da construtora e vendedora, determinando que, irradiando efeitos materiais, pois privara a adquirente do uso do imóvel desde a data prometida até a data em que se aperfeiçoe a entrega, sejam compostos os danos ocasionados à consumidora traduzidos nos frutos que deixara de auferir com a fruição direta ou locação do imóvel, pois consubstanciam lucros cessantes que efetivamente deixara de auferir.
8. Configurado o atraso injustificado na entrega do imóvel prometido à venda, considerado, inclusive, o prazo de prorrogação convencionado, ensejando que a consumidora ficasse privada de dele usufruir economicamente durante o interstício em que perdurara a mora da construtora, assiste-lhe o direito de ser compensada pecuniariamente pela vantagem econômica que deixara de auferir no interregno em que persistira a mora, cujo montante deve ser aferido com lastro nos alugueres que poderiam ter sido gerados pela unidade imobiliária, pois refletem os lucros cessantes que deixaram de auferir enquanto privado do uso da coisa.
9. Apelação conhecida e parcialmente provida. Unânime.
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Acórdão 815769, 20130110731786APC, Relator(a): TEÓFILO CAETANO, , Revisor(a): ALFEU MACHADO, 1ª TURMA CÍVEL, data de julgamento: 21/8/2014, publicado no DJE: 3/9/2014. Pág.: 69)