DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. DANO MORAL COLETIVO. CONDENAÇÃO SEM PEDIDO NA INICIAL. SENTENÇA EXTRA PETITA. CASSAÇÃO PARCIAL DE OFÍCIO. PREJUDICIAL DE PRESCRIÇÃO. REJEIÇÃO. PRELIMINARES DE COISA JULGADA E CONEXÃO. INDEPENDÊNCIA DAS ESFERAS CRIMINAL E CÍVEL. SENTENÇA ABSOLUTÓRIA POR FALTA DE PROVA. NÃO VINCULAÇÃO. PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA. INQUÉRITO CIVIL. PROCEDIMENTO INQUISITIVO. PROVA ORAL. DESNECESSIDADE. MÉRITO. CONTRATAÇÃO DIRETA POR INEXIGIBILIDADE DE LICITAÇÃO. CAMPEONATO DE JUDÔ. DIRECIONAMENTO INDEVIDO DE VERBA DERIVADA DE EMENDA PARLAMENTAR. PROPOSTA INIDÔNEA APRESENTADA PELA PRÓPRIA CONTRATADA. INDICAÇÃO DE DESPESAS E INJUSTIFICÁVEL. APROVAÇÃO INDEVIDA. PAGAMENTO SEM PRÉVIA COMPROVAÇÃO DE EXECUÇÃO DE DESPESAS E COM APURAÇÃO DE REGULARIDADE PENDENTE. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. CONSTATAÇÃO. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE DESTINAÇÃO DOS RECURSO PÚBLICOS AO EVENTO DESPORTIVO. DANO AO ERÁRIO EQUIVALENTE AO VALOR DA CONTRATAÇÃO. INDIVIDUALIZAÇÃO DAS CONDUTAS. ADMINISTRADOR DO DISTRITO FEDERAL. ATUAÇÃO DIRETA E INTENCIONAL PARA O ATO ILÍCITO. CONDENAÇÃO MANTIDA. ASSESSOR TÉCNICO E DIRETOR ADMINISTRATIVO. ATUAÇÃO SEM EFEITO VINCULANTE OU PODER DECISÓRIO. ABSOLVIÇÃO. COMINAÇÃO DA PENA. EXCESSO NA SENTENÇA. APLICAÇÃO CUMULATIVA DAS SANÇÕES DO ART. 12, II, DA LEI Nº 8.429/1992, MAS EM PATAMAR MÍNIMO. 1. Deve ser parcialmente cassada a sentença, de ofício, quanto à condenação dos réus ao pagamento de dano moral coletivo, já que se trata de provimento extra petita, uma vez que não foi formulado pedido equivalente pelo Ministério Público na petição inicial. 2. É impertinente a alegação de conexão entre ação civil por ato de improbidade e ação criminal, pois a conexão é meio de alteração de competência territorial, de natureza relativa, não afetando a competência funcional e absoluta por matéria, exercida por juízos cíveis e criminais. 3. A sentença proferida no âmbito criminal somente repercute na esfera administrativa/cível em duas hipóteses: quando reconhecida a inexistência material do fato ou quando comprovada a improcedência da imputação da autoria, o que não ocorreu no caso concreto. 3.1. Na hipótese, a sentença criminal absolutória antecedente não afastou a materialidade delitiva e não declarou a inexistência de autoria, revelando hipótese de absolvição por falta de provas naquele processo, o que, à luz dos arts. 65 e 66 do CPP, não produz efeitos no Juízo Cível, inclusive para fins de improbidade administrativa, devendo ser rejeitada a preliminar de coisa julgada. 4. É imprescritível a pretensão de ressarcimento de danos causados ao Erário por atos de improbidade administrativa. Para as demais sanções a contagem da prescrição tem como termo inicial a data em que o fato se tornou conhecido pela autoridade competente para apuração, no caso de servidores públicos efetivos, enquanto para os ocupantes de cargo comissionado, o prazo inicia-se quando findo o vínculo com a Administração Pública. 4.1. No caso dos autos, a ação de improbidade foi ajuizada dentro do prazo de cinco anos, contados tanto da primeira comunicação dos fatos para apuração administrativa, quanto da exoneração dos réus do cargo em comissão que exerciam, de modo que não há prescrição a declarar, nos termos do art. 23, I e II, da Lei nº 8.429/1992. 5. O art. 8º, § 1º, da Lei 7.347/85, faculta ao Ministério Público a instauração de inquérito civil para apuração de fatos de forma antecedente ao ajuizamento de ação civil pública, tratando-se de procedimento inquisitivo de apuração, no qual não se exige a garantia de contraditório, que deve ser exercido em eventual ação judicial derivada da apuração. 6. As questões controvertidas estão suficientemente documentadas nos autos e a resolução do litígio não prescinde de produção de prova oral, mas sim da valoração do acervo probatório já produzido, que permite a formação de convencimento pleno a respeito da imputação apresentada em face dos apelados. Preliminar de cerceamento de defesa rejeitada. 7. Para a caracterização da violação ao disposto no art. 10, VIII, da Lei de Improbidade Administrativa revela-se necessário: a) que haja o ato de frustrar a regularidade do procedimento licitatório, inclusive com a dispensa ou inexigibilidade irregulares; b) atuação do agente público; c) dolo, ou seja, ciência de que está sendo praticado um ato ilegal, ou mesmo a título de culpa grave, com a não adoção das cautelas necessárias; e d) dano ao Erário, aqui especialmente, inclusive o dano moral coletivo. 8. Na hipótese dos autos verifica-se a prática de improbidade administrativa por incursão ao art. 10, VIII, XI e XII, da Lei nº 8.429/1992, em razão de irregularidades e ilicitudes graves que permearam a contratação de empresa para organização de evento esportivo privado, de acordo com projeto por ela própria elaborado, em violação ao art. 9º, I, da Lei 8.666/1993, com incidência de cobranças injustificáveis de serviços que não dispensam concorrência pública, sem pesquisa de mercado e sem sequer firmar contrato administrativo. 8.1. Verifica-se demonstrado ajuste para destinação do exato montante disponibilizado em emenda parlamentar de elevado valor, mediante proposta fictícia, utilizando-se de evento esportivo local e privado, de porte incompatível com a verba pública destinada, como se tratasse de uma competição internacional dotada de relevância que justificasse o apoio do Estado. 8.2. Não se constatou direito de exclusividade da empresa contratada e não consta dos autos qualquer comprovação de expertise, ou mesmo prova da realização de eventos equivalentes em momento anterior, sendo que a proposta apresentada, além de serviços técnicos que cabiam à Federação Metropolitana de Judô, envolvia apenas serviços e produtos comuns, passíveis de plena concorrência pública. Ainda assim, foi aprovada a contratação, sem observar ressalvas de parecer técnico, e realizado o pagamento enquanto pendente apuração pela Controladoria Geral do Distrito Federal, sem prévia comprovação da execução das despesas contratadas. 9. Não restou demonstrado perante a Administração Pública, perante o Ministério Público, ou nesse processo que a empresa contratada tenha dado aos recursos públicos destinação vinculada à realização do evento desportivo, que contou com patrocínio particular, de modo que se apura dano ao Erário, em valor equivalente ao da contratação. 10. Na análise da individualização das condutas, verifica-se correta a condenação do então Administrador Regional do Núcleo Bandeirante, que atuou de forma pessoal e consciente, com culpa grave, para a prática dos atos de improbidade administrativa, constatado tanto na formação quando na execução da contratação direta por inexigibilidade de licitação. 10.1. Verifica-se que teve participação no ajuste para destinação dos valores, partindo de seu gabinete a tramitação da proposta de contratação, aprovou a contratação claramente ilícita e o promoveu o pagamento sem comprovação da execução de despesas, enquanto a relação jurídica era objeto de apuração pela Controladoria Geral do Distrito Federal. 10.2. A Prova Documental e Testemunhal produzida nos autos, demonstram à saciedade, da contratação ilícita e dos desvios em flagrante violação a LIA pelo Réu HAMILTON CAETANO DE BRITO. 11. Quanto ao Assessor Técnico denunciado, verifica-se a improcedência da imputação, pois se limitou a exarar parecer técnico sem efeito vinculante e que não se mostrou determinante para o ato ilícito, notadamente por ter ressalvado a necessidade de apresentação de projeto básico com especificação de despesas, adequação à legislação orçamentária e observância das formalidades legais. 12. Também não se justifica a condenação do Diretor Administrativo acusado, já que não exerceu nenhum poder decisório a respeito da contratação, na qual atuou apenas para promover impulso processual e dar cumprimento às determinações exaradas pelo Administrador Regional. 13. Havendo contratação indevidamente sem necessária licitação, impondo mensurável prejuízo aos cofres públicos, é imperativa a condenação cumulativa nas penas do art. 12, II, da Lei nº 8.429/1992, mas cominadas individualmente em seu patamar mínimo, com multa em valor equivalente ao dos danos causados, o que se mostra adequado e proporcional à gravidade da conduta, pois não se constata reiteração de conduta ilícita e os motivos e circunstâncias da improbidade administrativa são inerentes à imputação legal. 14. Sentença parcialmente cassada de ofício. Prejudicial de prescrição e preliminares processuais rejeitadas. Recursos dos réus EDER TRINDADE FABENI, MANOEL BATISTA DE OLIVEIRA NETO providos. Apelo do réu HAMILTON CAETANO DE BRITO parcialmente provido.