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Classe do Processo:
00300195820168070001 - (0030019-58.2016.8.07.0001 - Res. 65 CNJ)
Registro do Acórdão Número:
1245575
Data de Julgamento:
29/04/2020
Órgão Julgador:
5ª Turma Cível
Relator:
MARIA IVATÔNIA
Data da Intimação ou da Publicação:
Publicado no PJe : 08/05/2020 . Pág.: Sem Página Cadastrada.
Ementa:
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ENSINO SUPERIOR. REALIZAÇÃO DE CURSO SUPERIOR DE EDUCAÇÃO FÍSICA NÃO RECONHECIDO PELO MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. LICENCIATURA E BACHARELADO. PREJUÍZO MATERIAL CONFIGURADO. DANO MORAL COLETIVO. DEVER DE REPARAÇÃO. 1. Pressupostos processuais são requisitos jurídicos exigidos por lei para que a relação processual se constitua validamente (pressupostos de existência ou de constituição válida) e se desenvolva regularmente (pressupostos de desenvolvimento), permitindo a entrega de um provimento jurisdicional de mérito. Existem pressupostos de natureza SUBJETIVA, que estão relacionados aos sujeitos do processo e de natureza OBJETIVA, relacionados à forma procedimental e à ausência de fatos que impeçam a regular constituição do processo, segundo a sistemática do direito processual civil. Com relação à inexistência de litispendência e de coisa julgada (pressupostos processuais negativos), o Código de Processo Civil define a sua ocorrência quando são ajuizadas ações idênticas em que há correspondência de todos os seus elementos: partes, causa de pedir (próxima e remota) e pedido (mediato e imediato). No caso, constata-se que existe apenas parcial coincidência de partes, de causa de pedir e de um único pedido entre as duas ações civis públicas, sendo que a presente apresenta causa remota mais ampla, de modo que não estão presentes a igualdade dos elementos da ação exigida nos §§ 1º a 4º do art. 337 do CPC/2015. 2. Conforme previsto na Constituição Federal, a educação constitui direito fundamental de natureza social, servindo ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho (art. 5º, XIII, art. 6º e art. 205 da CF). Para garantir a ampla efetivação desse direito o ensino também é conferido à iniciativa privada, desde que, dada a sua natureza pública e visando à salvaguarda do padrão de qualidade, sejam cumpridas as normas gerais da educação nacional e atendidas as autorizações e avaliações de qualidade pelo Poder Público (art. 206, VII e art. 209, I e II da CF). No âmbito infraconstitucional, a Lei 9.394/1996 institui as diretrizes e bases da educação nacional, prevendo, dentre outras questões, que a educação superior deve ser ministrada por instituições de ensino superior (arts. 16 e 45), bem como o credenciamento de instituições, a autorização e o reconhecimento de cursos, terão prazos limitados, sendo renovados, periodicamente, após processo regular de avaliação pelo órgão competente (art. 9º, IX e art. 46). Além disso, estabelece o reconhecimento dos cursos oferecidos pelas instituições de ensino como condição de validade dos diplomas (art. 48). Já a organização do ensino superior e o exercício das funções de regulamentação, supervisão e avaliação das instituições de educação superior e dos cursos superiores foram disciplinados inicialmente pelo Decreto 2.207/1997, e, sucessivamente, pelos Decretos 2.306/1997, 3.860/2001, 5.773/2006 e 9.235/2017, também exigindo o reconhecimento de curso pelo órgão competente como condição necessária para a validade nacional dos respectivos diplomas. Por último, no campo infralegal, os procedimentos para a autorização, reconhecimento e renovação do reconhecimento de cursos de nível superior para que uma instituição de ensino funcione de forma regular são disciplinados pelo Ministério da Educação, conforme minuciosamente descrito pelo órgão em notas técnicas acostadas aos autos. 3. No caso em julgamento, consta dos autos que as instituições de ensino ofertavam curso de graduação em educação física semipresencial nas modalidades licenciatura e bacharelado. No que tange à regularidade do oferecimento do curso, ponto central da matéria debatida nos autos, depreende-se que pela Portaria MEC 2.691/2003 houve o credenciamento da instituição de ensino. Pelas Portarias MEC 2.693/2003 e 939/2006 também havia sido inicialmente autorizado o oferecimento do curso presencial de educação física a ser realizado na cidade de Patos de Minas/MG exclusivamente na modalidade de licenciatura. No entanto, no ano de 2010, o curso de licenciatura em educação física foi extinto a requerimento da própria instituição de ensino conforme informado pelo próprio Ministério da Educação. 4. Apesar das instituições apelantes terem protocolado requerimento objetivando novo reconhecimento do curso de educação física nas modalidades de licenciatura e bacharelado, a aprovação oficial ainda não havia sido concedida, como determina a legislação de regência. Desse modo, tanto a efetivação das matrículas quanto o fornecimento do curso de educação física de maneira irregular constituem fato incontroverso no processo. 5. Afigura-se ilegítima a oferta de curso sem a obtenção prévia da imprescindível autorização, fato, inclusive, já abordado por este Tribunal no âmbito do que foi objeto de julgamento da ação civil pública 2015.07.1.000669-8 e também em algumas demandas individuais ajuizadas por ex-alunos. 6. Diante do oferecimento de curso não autorizado, as instituições de ensino apelantes e os seus dirigentes assumiram a responsabilidade pelos ônus derivados da sua conduta, sendo inequívoca a lesão ao direito dos alunos consumidores. A responsabilidade nesse caso, inclusive, é de natureza objetiva, conforme reiterada jurisprudência e entendimento sumulado do Superior Tribunal de Justiça (Súmula 595/STJ). 7. Não há que se falar em culpa exclusiva de terceiro, seja no tocante à imputação de morosidade ao Ministério da Educação, seja quanto à recusa indevida do registro pelo conselho profissional, situações que não têm o condão de afastar a responsabilidade civil da instituição de ensino perante os alunos, a qual decorre do defeito na prestação do serviço (STJ. Resp 1232773/SP, Rel. Min. João Otávio de Noronha, Terceira Turma, Dje de 03/04/2014). Por envolverem relação jurídica distinta, os fatos alegados pelas requerentes que são inerentes à atividade empresarial desenvolvida deveriam ter sido combatidos na via própria contra quem de direito, mas não repassados aos alunos, consumidores e destinatários finais dos serviços educacionais oferecidos. 8. A Lei 8.078/1990 garante aos consumidores a efetiva reparação pelos danos sofridos (art. 6º, VI). Assim, são direitos básicos do consumidor, considerado individualmente ou no plano difuso ou coletivo, a prevenção e a reparação dos danos patrimoniais e morais que porventura tenham experimentado em razão de uma conduta abusiva do fornecedor. O Código de Defesa do Consumidor trouxe tanto a tutela individual do consumidor como a tutela coletiva da comunidade consumidora, que também pode ser vítima de uma prática abusiva de um fornecedor, o que enseja o dever de reparar o dano coletivo experimentado. Ressalta-se que o dano moral coletivo não significa a somatória dos danos individuais suportados pelos consumidores pela violação de um direito pessoal desses, mas uma nova modalidade de dano, o qual tem por objeto a violação de um direito da coletividade considerada em si mesma vítima de uma ação danosa do fornecedor. Não se pode esquecer que um dos valores do Estado Democrático de Direito brasileiro é a defesa do consumidor, contida tanto no rol dos direitos fundamentais (art. 5º, XXXII, como nos princípios da ordem econômica enunciados pela Constituição Federal (art. 170, V), de maneira que, considerado em sua dimensão objetiva, é um direito da comunidade em si mesmo e passível de violação, uma vez desatendidos os ditames legais prescritos pelo legislador ordinário por determinação do poder constituinte, ensejando a devida compensação coletiva. Como concretização da defesa do consumidor, a dimensão objetiva dessa proteção traz uma carga transindividual, comunitária, a qual tanto o Estado como os indivíduos devem obedecer e promover considerando a eficácia vertical e horizontal dos direitos fundamentais, sob pena de se incorrer em omissão legislativa e/ou dano coletivo. 9. No caso, a falha na prestação do serviço decorrente do fornecimento de curso sem credenciamento, contrariando a legislação de regência e afetando a coletividade de consumidores, ante a falta de informação adequada e suficiente sobre a real situação do curso oferecido, extrapolou a mera relação individual, violando direito coletivo. Além disso, a ausência de autorização e/ou reconhecimento do curso pelo poder público frustra as legítimas expectativas e inviabiliza os correspondentes benefícios naturalmente esperados com o título profissional perseguido, implicando não apenas adimplemento defeituoso da obrigação contratual, mas, em certos casos, em inadimplemento absoluto (STJ. REsp 773994/MG, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 22/05/2007, DJ 18/06/2007 p. 258). 10. Tal proceder enseja a reparação patrimonial (restituição dos valores em razão do curso pelos alunos) e extrapatrimonial, não apenas na esfera individual, considerando que o seu fornecimento gerou um dano aos alunos matriculados individualmente considerados, mas também de ordem coletiva. Consoante orientação jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça, nos casos em que a conduta antijurídica afeta, intoleravelmente, valores e interesses coletivos fundamentais, mediante conduta maculada de grave lesão, o dano moral coletivo se configura in re ipsa, isto é, independentemente da comprovação de dor, sofrimento ou abalo psicológico 11. Recurso conhecido e desprovido.  
Decisão:
CONHECER. REJEITAR PRELIMINAR. NEGAR PROVIMENTO. UNÂNIME.
Termos Auxiliares à Pesquisa:
VALOR DA INDENIZAÇÃO R$ 100.000,00.
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Inteiro Teor:
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