AÇÃO DECLARATÓRIA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI DISTRITAL 4.092/2008, ART. 10, INCISO III. EXCEÇÃO LEGAL PARA IGREJAS E CULTOS EM RELAÇÃO ÀS PROBIÇÕES DE EMISSÃO DE SONS E RUÍDOS ACIMA DO NÍVEL MÁXIMO DE PRESSÃO SONORA PERMITIDO. PRECEDENTE: ADI 20090020015645. NOVA LEI COM IDÊNTICO CONTEÚDO. POSSIBILIDADE. LIBERDADE RELIGIOSA E LIVRE EXERCÍCIO DE CULTO. DIREITO FUNDAMENTAL. INEXISTÊNCIA DE DIREITO ABSOLUTO E IRRESTRINGÍVEL. PRINCÍPIO DA HARMONIZAÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS HORIZONTAIS. DIREITO À SAÚDE. DIREITO AO MEIO AMBIENTE SADIO. PODER DE POLÍCIA. POLÍTICAS URBANAS. AÇÃO PROCEDENTE.
1. É cabível a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) perante este Tribunal de Justiça, tendo em vista que a Constituição Federal, no art. 125, § 2º, outorga aos Estados e, por extensão, ao Distrito Federal, competência para apreciar representação de inconstitucionalidade cujo objeto consista em lei estadual ou municipal em confronto com a Constituição Estadual ou Lei Orgânica do Distrito Federal.
2. O Poder Legislativo distrital, ao editar nova norma veiculando o mesmo conteúdo normativo já declarado inconstitucional (ADI 20090020015645), se ampara na independência dos Poderes estatais, eis que não fica vinculado à decisão proferida pelo Poder Judiciário em controle abstrato de constitucionalidade normativa (art. 129, RITJDFT).
3. A liberdade religiosa cuida-se de direito fundamental, assegurado pela garantia constitucional do livre exercício de cultos religiosos.
4. Não há direitos absolutos, ilimitados e ilimitáveis. Pela aplicação do princípio da harmonização dos direitos fundamentais horizontais, é preciso ponderar os direitos em conflito para compatibilizá-los.
5. É desprovido de motivação válida, é irrazoável e desproporcional ato normativo que admite a irrestrita liberdade religiosa, alocando-a acima de todo e qualquer outro direito fundamental.
6. O direito à saúde é prerrogativa constitucional indisponível, sendo dever do Estado implementar políticas públicas que instrumentalizem este direito (art. 204, I, LODF).
7. A submissão dos vizinhos a constantes incômodos gerados pela violação de seus domicílios, ambientes de trabalho ou de lazer pelo som excessivo (acima do limite legal), sem qualquer restrição de volume, horário e constância, significa restrição exagerada ao direito à saúde física e mental.
8. O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, essencial à sadia qualidade de vida, está expresso na LODF.
9. O ruído é um agente poluidor capaz de alterar o equilíbrio e a harmonia de qualquer ecossistema, subjugando a tranquilidade e o sossego, além de violar, em hipóteses mais extremas, a própria dignidade da pessoa humana. Ainda que possa ser considerado fenômeno tipicamente urbano, não deve merecer comportamento tolerante ou complacente do Poder Público. (ADI 2009 00 2 0015645-5).
10. Não há inconstitucionalidade do preceito questionado por violação ao art. 15, inciso XIV, da LODF. Isto porque, a competência privativa do Distrito Federal para exercer o poder de polícia administrativa não restou violada, já que o legislador apenas regulou matéria antes descoberta, o que também é uma faceta do poder de polícia, em sentido amplo.
11. As políticas urbanas devem estar afinadas em um conjunto de medidas que promovam a melhoria da qualidade de vida e devem estar calcadas nos princípios: da justa distribuição de benefícios e ônus decorrentes do processo de urbanização; prevalência do interesse coletivo sobre o individual; e combate a todas as formas de poluição. A função social da propriedade urbana é preenchida quando, dentre outros valores, é protegido o meio ambiente. É inconstitucional preceito normativo contrário aos princípios que norteiam as políticas urbanas.
12. Procedente o pedido para declarar, com efeitos ex tunc e eficácia erga omnes, a inconstitucionalidade material do inciso III, do art. 10, da Lei Distrital n.º 4.092/2008, por incompatibilidade vertical com a Lei Orgânica do Distrito Federal.