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Classe do Processo:
20120111304407APC - (0036066-87.2012.8.07.0001 - Res. 65 CNJ)
Registro do Acórdão Número:
960603
Data de Julgamento:
17/08/2016
Órgão Julgador:
1ª TURMA CÍVEL
Relator:
ALFEU MACHADO
Data da Intimação ou da Publicação:
Publicado no DJE : 25/08/2016 . Pág.: 131-144
Ementa:

CIVIL. PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. CONTRATOS DE MÚTUO. ENTIDADE DE PREVIDÊNCIA FECHADA. I) PRELIMINAR DE AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA. ART. 514 DO CPC/1973. VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE. NÃO VERIFICAÇÃO. AUSÊNCIA DE REPETIÇÃO DE ARGUMENTOS. PRELIMINAR REJEITADA. II) MÉRITO: SÚMULA 563 DO STJ. AFASTAMENTO. APLICAÇÃO DO CDC. LIMITAÇÃO DE DESCONTOS EM FOLHA DE PAGAMENTO A 30% DOS PROVENTOS DE APOSENTADORIA. LEI Nº 10.820/2003. EMPREGO POR ANALOGIA. POSSIBILIDADE. PRESERVAÇÃO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E DO MÍNIMO EXISTENCIAL. SALÁRIO. DIREITO CONSTITUCIONALMENTE PROTEGIDO (ART. 7º, INCISO X). PRINCÍPIO DA BOA FÉ E DA FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO. ÔNUS DA PROVA. ART. 333, INCISO II, DO CPC/1973. INOBSERVÂNCIA. APELAÇÃO CONHECIDA E NÃO PROVIDA. SENTENÇA MANTIDA.

1 - Pelo princípio da dialeticidade, que norteia o recebimento e o conhecimento dos recursos, o recorrente se utiliza do referido instrumento processual para, além de manifestar seu descontentamento com a decisão prolatada, impugnar todos os fundamentos externados na decisão combatida, demonstrando a sua insustentabilidade e, por consectário, oportunizar um novo julgamento da matéria posta em debate.

1.1 - As formulações genéricas, tanto afirmativas quanto negativas, a transcrição da petição inicial ou da defesa, ou a omissão quanto à demonstração dos pontos a decisão que estariam eivados de erro de julgamento, ante a dissonância com a lei ou com provas dos autos, evidenciam a ausência de interesse recursal apta a impor o não conhecimento do recurso, que é o caso do presente feito.

1.2 - Não obstante,in casu, verifica-se que na r. sentença o pedido do autor/apelado foi julgado procedente em relação à ré/apelante sob o fundamento de que seria aplicada ao caso a Lei nº 10.820/2003, que admite desconto em folha de pagamento limitado ao percentual de 30% do valor auferido, resguardando parte da remuneração do devedor em contemplação ao princípio da dignidade da pessoa humana a fim de que a soma dos descontos empreendidos pela apelante na folha de pagamento do apelado não ultrapassassem referido percentual.

1.2.1 - Em apelação, foram aventadas as teses de inaplicabilidade do CDC à luz de jurisprudência do C. STJ, que a Lei nº 10.820/2003, destinada aos empregados regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, não poderia ser aplicada ao caso em razão de o apelado não ser empregado da apelante, bem como que os contratos foram celebrados entre as partes de maneira livre e espontânea e que qualquer revisão ou readequação ensejaria violação ao sinalagma contratual, restando notório que não houve mera reiteração de temas, tendo a r. sentença sido impugnada efetivamente quanto a pontos de sua fundamentação com a finalidade de sua reforma, o que se mostra em consonância ao disposto no art. 514, inciso II, do CPC/1973, motivo pelo qual a rejeição da preliminar evocada é medida que se impõe.

2 - O c. STJ enveredou sua jurisprudência no tocante às entidades fechadas de previdência complementar para estatuir que o CDC não rege as relações entre estas e seus participantes (Súmula 563). No entanto, tal regra direciona-se à análise e interpretação da atividade precípua das entidades fechadas de previdência, notadamente orientando os contratos firmados entre estas e seus participantes que guardem relação com a administração de reservas financeiras com a intenção de compor aposentadoria complementar, bem como vislumbrando garantir outros benefícios de cunho previdenciário, consoante disponha o respectivo Plano de Benefícios, o que não se observa no caso em análise, uma vez que se tratam de contratos de mútuo feneratício, de natureza diversa da previdenciária, motivo pelo qual deve-se aplicar as normas do CDC à espécie.

3 - O salário, diante de sua natureza alimentar, é instituto protegido constitucionalmente (art. 7º, inciso X, da Constituição Federal) contra eventuais abusos contra ele impingidos, dentre os quais se encontra sua retenção dolosa.

3.1 - Afim de dar efetividade à norma constitucional mencionada e contemplar a natureza alimentar do salário, foram criados alguns mecanismos cujo objetivo é garantir a proteção desse instituto de forma a assegurar o princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da Constituição Federal) e o mínimo existencial inerente a todos os indivíduos, dentre os quais se encontram a impenhorabilidade do salário disposta no artigo 649, inciso IV do Código de Processo Civil, a Lei nº 10.820/2003 e o Decreto nº 6.386/2008 que tratam da consignação em folha de pagamento para os empregados regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho e para os servidores públicos federais, respectivamente, bem como a Lei Complementar Distrital nº 840/2011 e o Decreto Distrital nº 28.195/2007, que dispõe sobre as consignações em folha de pagamento dos seus servidores civis e militares.

3.2 - A jurisprudência tem se firmado no sentido de que é vedada a apropriação integral ou de grande parte da remuneração do consumidor ante a patente violação ao princípio da dignidade da pessoa humana e do mínimo existencial.

3.3 - No caso em questão, apesar de a apelante afirmar ainaplicabilidade da Lei nº 10.820/2003 por ser destinada aos empregados cujo contrato de trabalho seja regido pela CLT, bem como aos titulares de benefícios de aposentadoria e pensão do Regime Geral de Previdência Social, o que não é o caso dos autos tendo em vista que o autor/apelado não é seu empregado, mas do Banco do Brasil, em razão da ausência de legislação própria e em contemplação ao CDC, nada impede que referida lei seja aplicada por analogia ao presente caso a fim impedir a constrição da remuneração do apelado de forma que macule o mínimo necessário à sua sobrevivência, salvaguardando sua dignidade enquanto pessoa.

3.3.1 - Dos documentos que instruem o presente feito, especialmente o de fl. 16, afere-se que os descontos diretamente em folha efetuados pela apelante são abusivos, por superarem a margem consignável de 30%, à luz das normas retrodispotas.

3.4 - Conquanto condenável o endividamento desmesurado e a falta de planejamento financeiro por parte do consumidor, a entidade concedente de crédito deve agir em observância aos princípios da boa fé contratual e da função social do contrato, mormente quando pode aferir a capacidade econômica do contratante, que já possui comprometida sua remuneração mensal, devendo primar pela salvaguarda dos direitos da dignidade da pessoa humana e do mínimo existencial.

3.5 - Não se desincumbiu a apelante do ônus da prova disposto no art. 333, inciso II, do CPC/1973, segundo o qual, cabe o réu provar fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.

4 - Recurso conhecido e improvido. Sentença mantida.
Decisão:
CONHECER, REJEITAR A(S) PRELIMINAR(ES) E, NO MÉRITO, NEGAR PROVIMENTO, UNÂNIME
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Inteiro Teor:
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