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Classe do Processo:
20140110095276APC - (0002266-97.2014.8.07.0001 - Res. 65 CNJ)
Registro do Acórdão Número:
912776
Data de Julgamento:
16/12/2015
Órgão Julgador:
1ª TURMA CÍVEL
Relator:
ROMULO DE ARAUJO MENDES
Revisor:
TEÓFILO CAETANO
Data da Intimação ou da Publicação:
Publicado no DJE : 21/01/2016 . Pág.: Sem Página Cadastrada.
Ementa:

APELAÇÕES CIVIS (AUTOR E RÉU). AÇÃO CIVIL COLETIVA. DIREITO DO CONSUMIDOR. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. EMPREENDIMENTO IMOBILIÁRIO. APELAÇÃO DO RÉU. ILEGITIMIDADE ATIVA DO IBEDEC/DF. INSTITUTO AUTOR COM NATUREZA JURÍDICA DE ASSOCIAÇÃO. DEFESA DE DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. AUTORIZAÇÃO PARA ATUAÇÃO COMO SUBSTITUTO PROCESSUAL EXPRESSAMENTE PREVISTA NO ART. 5º, INCISO V DA LEI DA AÇÃO CIVIL PÚBLICA E NO ART. 82, IV, DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. PRELIMINAR REJEITADA. MÉRITO. CERCADO REALIZADO EM ÁREA PÚBLICA. INDUZIMENTO DO CONSUMIDOR ADQUIRENTE À CRENÇA DE TRATAR-SE DE ÁREA PRIVADA DESTINADA A ESTACIONAMENTO ROTATIVO DOS ADQUIRENTES SEM VAGA PRIVATIVA DE GARAGEM. RETOMADA DA ÁREA PELO PODER PÚBLICO. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. PROPAGANDA ENGANOSA. DANOS MATERIAIS CARACTERIZADOS (DESVALORIZAÇÃO DO IMÓVEL COM A PERDA DA GARAGEM ROTATIVA) A SEREM APURADOS EM LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA. APELAÇÃO DO AUTOR. DANOS MORAIS INDIVIDUAIS. OCORRÊNCIA. INTERESSES INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. CONDUTA ILÍCITA GERADORA DE DANO. PERDA DA DISPONIBILIDADE DA "GARAGEM ROTATIVA". RELEVÂNCIA DO BEM EM SE TRATANDO DE AQUISIÇÃO DE IMÓVEL. CONDUTA ENGANOSA CUJOS EFEITOS EXTRAPOLAM O MERO DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL OU ABORRECIMENTO DA VÍTIMA. QUANTUM REPARATÓRIO. ARBITRAMENTO. ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA MANTIDO. APELAÇÕES CONHECIDAS. NEGADO PROVIMENTO À APELAÇÃO DO RÉU. DADO PROVIMENTO À APELAÇÃO DO AUTOR. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA, PARA ACRESCENTAR A CONDENAÇÃO POR DANOS MORAIS INDIVIDUAIS.

1. O litígio, veiculado em Ação Civil Coletiva proposta pelo IBEDEC/DF, tem por objeto indenização por danos materiais e reparação por danos morais de que teriam sido vítimas os consumidores adquirentes de unidades residenciais no empreendimento Villa Provence, em virtude de alegada propaganda enganosa da construtora Ré, que, ao cercar área pública, posteriormente retomada pela Administração local, teria o escopo de fazer crer aos potenciais adquirentes que o condomínio disporia de vaga rotativa de garagem.

2. O instituto Autor, com natureza jurídica de associação sem fins lucrativos, detém legitimação extraordinária conferida pela lei para atuar em juízo em nome de seus associados, no caso, os consumidores, na qualidade de substituto processual, conforme expressa autorização contida no art. 5º, V, da Lei da Ação Civil Pública e no art. 82, IV, do Código de Defesa do Consumidor, tratando-se, como no caso, de direitos individuais homogêneos, os quais, segundo a definição do Código Consumerista, são aqueles decorrentes de origem comum (art. 81, parágrafo único, III).

3. Do cenário probatório constante dos autos chega-se à conclusão de que houve, efetivamente, conduta reprovável da construtora Apelante quanto aos meios utilizados para atrair o consumidor, certo de que, induzindo-o à crença de que o empreendimento dispunha de garagem externa rotativa, seria mais fácil a realização da venda da unidade residencial naquele edifício, em nítida violação da vedação à propaganda enganosa, nos termos do art. 37 do Código de Consumo, havendo nisto, pois, o ilícito praticado pela Apelante, sendo contrária à prova dos autos, assim, a alegação de que não existiu qualquer conduta ilícita que tenha praticado.

4. Ocorrência de dano material (dano emergente), consistente na desvalorização dos imóveis pela perda da disponibilidade da garagem rotativa, direito que a Apelante fez nascer para os adquirentes das unidades residenciais naquele empreendimento, em conseqüência da vinculação a que se obrigou pela veiculação da propaganda enganosa aqui verificada.

5. Presentes, pois, todos os elementos que configuram a responsabilidade civil, nos termos do art. 186 do Código Civil ("Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito"), tal como reconheceu a sentença recorrida, devendo a Apelante pagar aos autores substituídos o valor a ser apurado em liquidação de sentença, segundo disposto naquele decisum.

6. Opleito de reparação por danos morais individuais, tal como os danos materiais, pode ser vindicado coletivamente (art. 81, CDC), desde que se trate de danos relativos a direitos ou interesses individuais homogêneos, como se verificou na espécie.

7. Quanto à configuração do dano moral individual, expressão dos direitos individuais homogêneos discutidos nos autos, é entendimento pacífico na jurisprudência desta Corte que o mero inadimplemento contratual não é suficiente para caracterizar esse dano de ordem extrapatrimonial, por representar aborrecimento normal do cotidiano na complexa sociedade atual.

8. Contudo, a situação dos autos não pode ser considerada um mero aborrecimento ou percalço da vida moderna. Não se tem simples descumprimento de cláusula contratual, mas veiculação de ardilosa propaganda enganosa, a qual, a despeito de não se ter manifestado expressamente na divulgação oficial do empreendimento, por meio dos folders impressos, fora urdida em moldes mais sutis, de certo para escapar a eventual responsabilidade civil, objetivo que, como se está a demonstrar, não logrará êxito.

9. Daconduta ilícita praticada pela empresa Construtora, ferindo frontalmente o disposto no § 1º do art. 37 do Código Consumerista, emanaram conseqüências que, seguramente, podem ser caracterizadas como danos morais aos 31 adquirentes das unidades residenciais do empreendimento Villa Provence, que gozariam de maior segurança e conforto com o uso da garagem rotativa que supunham, inicialmente, estar à disposição dos moradores que não tinham a vaga de garagem privativa, como assim fez parecer o procedimento da Construtora, ao cercar o espaço público, dando-lhe ares de área privada pertencente ao empreendimento.

10. A repentina retirada da esfera de disponibilidade daqueles adquirentes de tal "direito a garagem rotativa" tem potencial de causar inegável frustração e significativa perturbação psíquica no morador, que já não disporá da facilidade de ter área reservada para estacionamento, item, sem sobra de dúvidas, relevantíssimo quando se pretende adquirir determinado imóvel, destacando-se, ainda, o fato de que a compra de um imóvel não é simples negócio jurídico de aquisição de um bem qualquer, tratando-se de sonho acalentado por milhões de famílias, para cujo alcance muitas vezes utilizam os recursos financeiros amealhados durante toda uma vida.

11. É dever legal e moral das construtoras/incorporadoras municiarem os consumidores das mais transparentes e precisas informações que lhes possibilitem tomar a decisão que mais se adéqüe aos seus interesses e necessidades, pois as conseqüências, por vezes desastrosas, de uma contratação dessa relevância, podem se propagar por toda a vida.

12. A empresa Apelada portou-se na contramão desses predicados éticos, daí não se poder negar a deflagração de dano moral decorrente das lesões aos atributos da personalidade (a integridade psíquica, a angústia d'alma) provocadas pelo ilícito praticado pela empresa Ré, ao descumprir o dever contratual anexo atinente à boa-fé objetiva (dever de informação, lealdade, probidade, confiança, ética etc), em vista da comprovada propaganda enganosa que engendrou.

13. Em relação ao quantum reparatório, deve-se ter em linha de pensamento que a indenização por danos morais tem dúplice caráter, vez que deve ensejar a reparação do abalo extrapatrimonial suportado pela vítima, sem, contudo, se afastar do caráter pedagógico-punitivo, com o propósito de inibir a reiteração de condutas similares. Há de ser imposta, sobretudo, com fundamento nos princípios constitucionais da razoabilidade e da proporcionalidade.

14. No caso dos autos, considerados os parâmetros que têm sido acolhidos pela jurisprudência, dos quais destaca-se a teoria do valor do desestímulo ou o caráter punitivo-pedagógico da reparação por danos morais, e sendo certo, ainda, que o valor arbitrado não deve ser tão alto, a ponto de gerar enriquecimento sem causa, e nem tão baixo, de modo a tornar ínfima a reparação, temos que o quantum reparatório, no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), para cada um dos adquirentes de unidades imobiliárias sem vaga de garagem no edifício Villa Provence, mostra-se adequado.

15. A sentença estabeleceu que a parte Ré deveria arcar com 50% das custas processuais e pagar o valor de R$ 6.000,00 (seis mil reais) de honorários advocatícios, valor que, a nosso juízo, se mostra adequado ao caso, mesmo após a reforma do julgado recorrido, considerada a apreciação equitativa do julgador, nos termos do art. 20, § 4º, do Código de Processo Civil.

16. Recursos conhecidos. Negado provimento ao Apelo da Ré e dado provimento ao Apelo do Autor, para reformar, em parte, a sentença recorrida, condenando a construtora Ré ao pagamento de danos morais no importe de R$ 5.000,00 (cinco mil reais).
Decisão:
CONHECER DOS APELOS, REJEITAR AS PRELIMINARES E, NO MÉRITO, NEGAR PROVIMENTO AO APELO DA RÉ E DAR PROVIMENTO AO APELO DO AUTOR, UNÂNIME
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