PENAL E PROCESSUAL. CONDENAÇÃO PELO CRIME DE TORTURA-CASTIGO. ALEGAÇÃO DE INCOMPETÊNCIA DO JUÍZO, NULIDADE DE EFEITOS INFRINGENTES NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO E PRECLUSÃO DO DIREITO DE PROMOVER NOVA DEFINIÇÃO JURÍDICA DO FATO. REJEIÇÃO DAS PRELIMINARES. PROVA SATISFATÓRIA DA MATERIALIDADE E AUTORIA. RELEVÂNCIA DA CONTRIBUIÇÃO DA VÍTIMA PARA A DEFLAGRAÇÃO DA AÇÃO CRIMINOSA. REVISÃO DA DOSIMETRIA. SENTENÇA REFORMADA EM PARTE.
1 Policiais Militares condenados por infringirem o artigo 1º, inciso II e §§ 3º, parte final, e 4º, da Lei 9.455/97, por espancarem e torturarem o dono de uma lanchonete e causarem sua morte, em represália por ter ligado o som do estabelecimento em alto volume, incomodando Policial Militar que residia nas imediações. Este acionou a CIADE e ensejou a presença de guarnição da corporação cujo comandante instou a vítima a desligar o som ou reduzir o seu volume. A vítima atendeu, mas quando os policiais saíram religou o som e passou a proferir impropérios contra o vizinho militar, que reagiu convocando outros militares, que vieram ao local e espancaram brutalmente a vítima, causando lesões que motivaram morte por traumatismo cranioencefálico, dois dias depois. Os réus foram denunciados perante o Tribunal do Júri por homicídio qualificado, mas os jurados absolveram o primeiro réu e desclassificaram a conduta dos demais para crime da competência diversa do Tribunal do Júri. O Juiz Presidente determinou a remessa dos autos à Auditoria Militar, entendendo configurado o crime de lesão corporal seguida de morte, mas, ante os embargos declaratórios do Ministério Público alegando omissão por falta de exame dos fatos à luz da Lei de Tortura (Lei nº 9.455/97), reapreciou a lide e condenou os réus com base nesta lei.
2 O crime de tortura é crime comum, sem correspondência no Código Penal Militar, não cabendo o seu julgamento à Justiça Castrense, senão à Justiça Criminal Comum. Não configura nulidade o fato de o Juiz acolher embargos de declaração, analisar os fatos à luz de outra norma e proceder à readequação das ações descritas na denúncia para o tipo da tortura-castigo e assim condenar os réus, depois da desclassificação operada pelo Conselho de Sentença.
3 O dolo específico de aplicar castigo de caráter pessoal a pessoa sob guarda, poder ou autoridade envolveu todos os réus, ao anuírem de forma livre e consciente com esse desiderato, cientes da contenda da vítima com o companheiro de caserna.
4 Se a vítima contribui decisivamente para a deflagração da ação criminosa, agindo de forma insolente e anti-social, e assim praticando contravenção penal de perturbação do sossego público e o crime de desobediência, seu comportamento enseja desconto na pena-base do réu.
5 Apelação parcialmente provida.
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Acórdão 838519, 20080310094474APR, Relator(a): GEORGE LOPES, , Revisor(a): SANDRA DE SANTIS, 1ª TURMA CRIMINAL, data de julgamento: 4/12/2014, publicado no DJE: 15/12/2014. Pág.: 113)